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COTIDIANO


Meu trabalho faz com que eu passe longas horas em casa.  E é exatamente o que eu gosto de poder fazer... talvez, exatamente por eu passar tantas horas em casa, eu às vezes me espante quando saio de casa. Talvez eu fique mais chocada com as coisas do que eu deveria, pois elas não fazem parte do meu cotidiano.

Ontem, ao esperar pelo ônibus, uma cena chocou-me. Algumas meninas, usando uniformes colegiais e aparentando terem entre treze e quinze anos, cantavam a letra de um funk com conotações sexuais óbvias e grosseiras, em alto e bom tom, enquanto dançavam, simulando estarem fazendo sexo.

Ao meu lado, um senhor idoso e algumas crianças bem pequenas, que observavam tudo.  Coloquei meu fones de ouvido e comecei a escutar música, para abafar aquele absurdo.  Os acordes heavy metal da banda  Avenged Sevenfold eram muito mais suaves.

Antigamente, se víssemos crianças comportando-se desta forma, poderíamos até pensar que elas não tinham real consiciência do que estavam fazendo, mas hoje em dia,  temos certeza de que elas não apenas estão conscientes do significado da letra da música, mas que provávelmente praticam o que cantam. Eu penso que tudo isto é muito triste...

Mais tarde, voltando para casa, uma outra cena chocante: uma senhora aparentando uns sessenta anos puxa a cordinha da campainha do ônibus, mas esta, por algum motivo, não soa. Ela grita, lá do meio do corredor, ao motorista, pedindo-lhe que pare, e reclamando que a campainha não tinha soado. O motorista, vermelho de raiva, passa a xingá-la de todas as formas, ofendendo-a com palavras de baixíssimo calão, e ordenando que ela se retirasse do ônibus. Eles passam a discutir em voz alta, e ela sai no momento exato em que ele ameaça levantar-se de sua cadeira. Fico pensando: será que ele pretendia agredí-la fisicamente?

Depois, ele arranca com o ônibus. Pelo espelho retrovisor, posso ver seus olhos injetados, seu rosto vermelho e suado de ódio. Constato que ele não tem a menor condição psicológica para transportar passageiros, ou para sequer, dirigir, mas sei que ele continuará seu trabalho até, talvez, tarde da noite, e quando o dia terminar, ele estará ainda mais cansado e estressado.

Cenas de um cotidano que não queremos ver, mas que se faz cada vez mais presente na vida de todos nós. Até quando?
Ana Bailune
Enviado por Ana Bailune em 03/10/2012
Reeditado em 03/10/2012
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