ACADEMIAS, GINÁSTICAS E O CALÇADÃO DA PRAIA
Por Carlos Sena


 
O calçadão da praia é um local muito democrático. Por isto e por muito mais é que eu tenho resistido entrar na academia para não ser taxado de sedentário. Na qualidade de diabético e hipertenso, os médicos sempre nos recomendam: faça caminhada ou entre numa academia. Outro dia entrei numa, mas saí e não achei graça. Mas, entrei como quem entra numa briga, numa igreja, numa festa. Pronto. Não me empolguei em pensar que iria ficar numa esteira caminhando sem saber aonde chegar, ou seja, me iludindo acerca do objetivo de caminhar que é chegar a algum lugar. Quando eu caminho no calçadão eu sei que vou chegar até Piedade, por exemplo, que é onde termina Boa Viagem e começa Jaboatão dos Guararapes.  Outra coisa que não gostei: ficar numa esteira ou noutras máquinas vendo televisão e me lascando de suor em nome do corpo sarado. Porque embora não sendo o meu caso, o é da maioria das pessoas que frequenta academia. Essa onda do corpo sarado não me pertence mais, pois não tenho doença no corpo para sarar, mas é assim que os boys e as girls se conduzem lá. Questão de gosto? Pode ser, mas no meu caso é questão de visão de mundo e de praticidade. No calçadão eu tenho ar puro no lugar de televisão. Eu tenho pessoas caminhando tranquilas. Umas até com um terço nas mãos talvez se entregando a Jesus, pois as caminhadas têm um pouco disto. A gente caminha por saúde e por doença. Quando caminhamos por saúde tudo se renova. Quando por doença também, mas com o acréscimo de que, idosos, geralmente querem um tempinho a mais antes de ir pra Jesus e aproveitam para rezar o terço durante a caminhada. Não é deboche, mas praticidade com a vida. Afinal, daqui não se sai com vida. Mas enquanto vida houver, a gente vai dentro dela se virando em frente e verso. Na frente a gente se engana que é Deus. No verso, a gente faz poesia para ser eterno enquanto ideia. Seguimos em frente sabendo que no final do calçadão tem um limite. Nas academias, o limite é o tempo que a gente paga para lá ficar e fazer aquelas acrobacias. Por isto é que resisto tanto à academia, embora reconheça que no inverno fica difícil caminha no calçadão pelo risco de contrair um resfriado, uma pneumonia e, assim, até mesmo bater a caçoleta. Bater a caçoleta é morrer. Tudo bem que se ninguém escapa com vida deste planeta, mas é bom que nos iludamos com a própria vida. Um sintoma disto é que mesmo sabendo que um dia morreremos, não perdemos o amor pela vida. Detalhes filosóficos de somenos importância.
O calçadão, repito, é muito democrático. Todos tem acesso a ele e, de lambujem, tem um banho de mar que por enquanto ainda é de graça. A água de coco, que maravilha! Não há dinheiro que pague uma água de coco depois de uma caminhada, Danuza Leão que nos diga. Pois é. A gente paga quatro reais numa coca-cola e paga dois num coco. Há quem reclame, mas que não reclama da coca-cola que é um xarope, literalmente. Novamente os valores nos invadem a orla – valores do capitalismo que não dá valor a uma água de coco, mas dá todo valor a um “veneno” que dá até pra desentupir pia como a coca-cola. Questão de gosto? Também acho. Mas acho igualmente que há quem goste dos olhos e quem goste da remela; há quem goste do chão, mas há quem goste da chinela. Independente, gosto é como fiofó e cada qual têm o seu, ou não? Assim, essa viagem acadêmica – de academia de ginástica não me agrada muito como me agrada o vento fresco do mar. O meu coco verde de água que não precisa ser doce. Doce é a vida e tudo que dela se depreende aos olhos de quem vive de bem com o mundo. Por isto, até hoje não me rendi às academias, talvez um dia a de letras. Quem dera! Mas, por enquanto meu calçadão da praia da Boa Viagem no Recife é o meu torrão matinal. Fone de ouvido, uma musica, brisa na cara, gente bonita dos lados, gente feia também. Passos largos, lentos, acelerados, como a vida. A diabetes? A Pressão alta? Vou perguntar a elas depois...