Cobertor Curto - EC
Eu precisava muito lavá-lo! Estava um horror!
De lã, rosinha, bem bonitinho, era o cobertor. Já estava curto e não a cobria completamente pois ela cresceu e ele infelizmente...Ficou no seu mesmíssimo tamanho.
Mas a doninha não o deixava um segundinho, principalmente na hora de dormir seu sonhinho fosse de manhã, fosse a tarde, fosse noite, no calor ou frio. Ela o esfregava no narizinho, como se estivesse fazendo um carinho nela mesma e, afastava a mão de quem quer que se aproximasse de seu rosto nesse momento. Ela se agarrava àquele cobertor de uma forma assustadora, autoritária, valente, prepotente.
Precisava escolher muito bem o dia de lavá-lo para não ter choradeira, evitar passar nervoso.
Os brinquedos, quaisquer que fosse não faziam a companhia que ela desejava na hora de dormir. Nem pai, nem mãe, nem irmãos, nem canto, acalanto ou coisa parecida acalmava a menininha tinhosa que queria, que exigia o seu “bitô”. Só sossegava quando lhe entregavam o dito cujo.
Um dia envergonhada de vê-la abraçada àquele pano sujo, mal cheiroso,quando ela se distraiu com um brinquedo e a presença de uns primos em casa o coloquei para lavar. Esfreguei o mais rápido que pude, fiz todo o esforço possível para deixá-lo limpinho e o coloquei no varal para secar.
Eis que em dado momento ela pede o “bitô”. Respondi que não sabia onde ele estava que ela o fosse procurar. Não ia achar pois não sabia procurar nada nos seus três anos de idade. Mas “enrolei” o que pude. Distraiu-se com a chegada de novos primos e o dia foi passando e, eu a todo momento testava o danado para ver se tinha secado. Virava de um lado para outro. Punha mais diretamente ao sol. Naquele tempo eu não tinha máquina de lavar, centrifugar, o que faz secar mais rápido. Uma agonia só.
Na despedida de um dos primos eles passaram pelo varal e... lá estava ele, rosinha, limpinho, molhadinho ainda. O que eles tinha que passar por ali? Quem mandou ir até o fundo do quintal ? Não tinha espaço suficiente lá na frente, na sala, no quarto? Que mania de querer sempre o que não pode!
“Bitô”! “Bitô”! E começou a seção petitória sem fim. Não chorei por muito pouco naquele dia! Não deu a mínima para o primo que foi embora. Foi tomar banho chorando, dei o jantar e ela pedindo o tal “bitô”. Parava um pouco e logo lembrava do bendito lá fora e queria ir buscar... um sufoco.
Eu tremia de nervoso. Que fazer meu Deus nessa situação. Nada a consolava. A noite avançou. Seus olhinhos já estavam inchados de chorar e de esfregar. O nariz parecia um tomate de vermelho.
A noite continuou avançando. Ela chorando... O pai tentava arranjar distração mas nada... Nem colo, nem brinquedo, nem desenho, nem pintura, nem recorte, nem pica-pica de papel, nem bolinha. Ela parava um pouco mas lembrava do “bitô” e começava de novo! Eu pensava: “Tá pedindo umas palmadas, é isso”!
Uma e meia da madrugada. Ninguém ainda tinha dormido direito. O bitô... o bitô...soluçando. Quase não saía sua voz. Fui ao varal com raiva das horas de tormento, arranquei do varal com tudo e ainda molhado joguei em cima dela.
Ela pegou uma ponta do cobertor que já era curto para ela, esfregou-o no nariz e quase em seguida dormiu. Dormiu de cansada de chorar, soluçando, soluçando...
Devolvi o cobertor ao varal. Um cobertor curto, de nenê, que não a cobria por inteiro, mas que ela adorava pela maciez, pela cor, pelo seu cheiro, sei lá.
Ela dormiu até mais de dez do dia seguinte e acordou pedindo o dito cujo que nessa altura já estava seco. E lhe entreguei com prazer.
Este texto faz parte do Exercício Criativo - Cobertor Curto
Saiba mais, conheça os outros textos:
http://encantodasletras.50webs.com/cobertorcurto.htm
Eu precisava muito lavá-lo! Estava um horror!
De lã, rosinha, bem bonitinho, era o cobertor. Já estava curto e não a cobria completamente pois ela cresceu e ele infelizmente...Ficou no seu mesmíssimo tamanho.
Mas a doninha não o deixava um segundinho, principalmente na hora de dormir seu sonhinho fosse de manhã, fosse a tarde, fosse noite, no calor ou frio. Ela o esfregava no narizinho, como se estivesse fazendo um carinho nela mesma e, afastava a mão de quem quer que se aproximasse de seu rosto nesse momento. Ela se agarrava àquele cobertor de uma forma assustadora, autoritária, valente, prepotente.
Precisava escolher muito bem o dia de lavá-lo para não ter choradeira, evitar passar nervoso.
Os brinquedos, quaisquer que fosse não faziam a companhia que ela desejava na hora de dormir. Nem pai, nem mãe, nem irmãos, nem canto, acalanto ou coisa parecida acalmava a menininha tinhosa que queria, que exigia o seu “bitô”. Só sossegava quando lhe entregavam o dito cujo.
Um dia envergonhada de vê-la abraçada àquele pano sujo, mal cheiroso,quando ela se distraiu com um brinquedo e a presença de uns primos em casa o coloquei para lavar. Esfreguei o mais rápido que pude, fiz todo o esforço possível para deixá-lo limpinho e o coloquei no varal para secar.
Eis que em dado momento ela pede o “bitô”. Respondi que não sabia onde ele estava que ela o fosse procurar. Não ia achar pois não sabia procurar nada nos seus três anos de idade. Mas “enrolei” o que pude. Distraiu-se com a chegada de novos primos e o dia foi passando e, eu a todo momento testava o danado para ver se tinha secado. Virava de um lado para outro. Punha mais diretamente ao sol. Naquele tempo eu não tinha máquina de lavar, centrifugar, o que faz secar mais rápido. Uma agonia só.
Na despedida de um dos primos eles passaram pelo varal e... lá estava ele, rosinha, limpinho, molhadinho ainda. O que eles tinha que passar por ali? Quem mandou ir até o fundo do quintal ? Não tinha espaço suficiente lá na frente, na sala, no quarto? Que mania de querer sempre o que não pode!
“Bitô”! “Bitô”! E começou a seção petitória sem fim. Não chorei por muito pouco naquele dia! Não deu a mínima para o primo que foi embora. Foi tomar banho chorando, dei o jantar e ela pedindo o tal “bitô”. Parava um pouco e logo lembrava do bendito lá fora e queria ir buscar... um sufoco.
Eu tremia de nervoso. Que fazer meu Deus nessa situação. Nada a consolava. A noite avançou. Seus olhinhos já estavam inchados de chorar e de esfregar. O nariz parecia um tomate de vermelho.
A noite continuou avançando. Ela chorando... O pai tentava arranjar distração mas nada... Nem colo, nem brinquedo, nem desenho, nem pintura, nem recorte, nem pica-pica de papel, nem bolinha. Ela parava um pouco mas lembrava do “bitô” e começava de novo! Eu pensava: “Tá pedindo umas palmadas, é isso”!
Uma e meia da madrugada. Ninguém ainda tinha dormido direito. O bitô... o bitô...soluçando. Quase não saía sua voz. Fui ao varal com raiva das horas de tormento, arranquei do varal com tudo e ainda molhado joguei em cima dela.
Ela pegou uma ponta do cobertor que já era curto para ela, esfregou-o no nariz e quase em seguida dormiu. Dormiu de cansada de chorar, soluçando, soluçando...
Devolvi o cobertor ao varal. Um cobertor curto, de nenê, que não a cobria por inteiro, mas que ela adorava pela maciez, pela cor, pelo seu cheiro, sei lá.
Ela dormiu até mais de dez do dia seguinte e acordou pedindo o dito cujo que nessa altura já estava seco. E lhe entreguei com prazer.
Este texto faz parte do Exercício Criativo - Cobertor Curto
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