"As Formigas"

O homem se encontrava sentado no seu banquinho de praça habitual; refletia sobre sua vida até então: seus erros, suas decepções e seus fracassos. Não conseguia relembrar dos bons momentos de sua vida, acreditava até que nunca houve bons momentos; mas lembranças ruins trasbordava em sua mente: pensava em suas perdas - coisas que tinha e hoje não tem mais. Percebeu que não trajava mais as roupas caras de antes, nem portava mais o celular moderno de sua adolescência; não tinha mais dinheiro, não tinha mais a força e o vigor da juventude para trabalhar, se sentia velho; não tinha mais esperanças. Era velho, como já dito, era também inútil, pois nada de produtível fazia o homem, era também desprezível - observava com atenção as coisas ao seu redor: as pessoas o olhavam com um constante desprezo, ou medo, ou repugnância, ou tudo junto.

Estava cansado da vida solitária que tinha, queria encontrar uma saída, a única saída que viu era de emergência, ou se preferir, de desespero: olhava o homem para os pulsos.

Um vira-lata que latia próximo ao homem chamou sua atenção, o velho se virou, olhou o vira-lata e comparou sua vida com a do animal - pode ver uma semelhança.

Continuava a observar, notava cada sutileza das coisas; viu uma borboleta, contemplava a beleza que a Natureza dera ao inseto; encantou-se tanto que quis escrever e descrever os detalhes daquele momento para compartilhar com os outros, porém, não tinha papel nem caneta. A borboleta voou e ele seguiu ela com os olhos - pousou ao lado de um formigueiro, e em seguida voou para longe, enquanto o homem observava. Voltou os olhos para as formigas que construiam grão por grão o formigueiro, onde a bela borboleta azul pousara a pouco; observava o esforço de cada formiga, sua fragilidade e sua força, através da união. Notou que eram muitas formigas e afirmou consigo que elas não eram solitárias, sempre andavam juntas, trabalhavam juntas, se alimentavam juntas, sempre dividindo o alimento da vez. Não sabia se elas eram felizes, mas sabia que elas não eram solitárias. Por um momento, se pegou pensando em querer ser uma formiga, mas ignorou o pensamento: "bobagem", mas viu que ele não desejava ser propriamente uma formiga, mas desejava ter a vida de uma; percebeu que para tal, deveria apenas agir como as formigas agiam, unidas. O homem conseguira uma gota de desejo em continuar a viver, feliz ou não, mas provavelmente feliz, e não solitário.

Não perdeu tempo: contou sua reflexão e sua ideia de reaproveitamente e uso criativo para benefício próprio do lixo para outros homens e mulheres, e pouco tempo depois, trabalhando unidos, conseguiram criar abrigos com materiais encontrados no lixo; e levavam sua vida reaproveitando e vendendo os objetos que encontravam.

Não demorou muito para outras pessoas reconhecerem o trabalho dos homens, que se denominavam, como grupo, "As Formigas", e lhes darem melhores recursos para produzirem seu trabalho com mais segurança e eficiência, em uma pequena indústria de reciclagem de lixo.

Raul Rosa
Enviado por Raul Rosa em 28/09/2012
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