FINGEM QUE É VERDADE A MENTIRA QUE DEVERAS ACREDITAM SER VERDADEIRA
Algumas palavras e certos hábitos e procedimentos perdem ou trocam de sentido ao longo do tempo. Foi-se o tempo que favela era o que era e assim era chamada; hoje é “comunidade”. Diferente era isso mesmo, hoje é “diferenciado”. Mulheres que escreviam poemas eram poetisas, hoje são chamadas de “poetas”. Quem presidia alguma coisa era presidente, homens ou mulheres, como Nélida foi da Academia Brasileira de Letras, como Ângela Bachelet foi do Chile, como Patrícia Amorim é do Flamengo e assim tantas outras foram ou são presidente de empresas, de países, de escolas de samba e dos mais inusitados lugares, como meu coração que é presidido por uma mulher, a Força, há décadas. Mas hoje há uma que quer porque quer ser chamada de presidenta. Eu sei, é uma jogada de márquetim político pra impressionar a “nova classe média”, um fenômeno sociológico e estatístico incompreensível e mesmo físico, pois abriga duas classes ocupando o mesmo espaço, ou é apenas uma tolice. Falando em tolice, o bom e arejado bonde – agora bem melhorado, é claro - é chamado de VTL. É pra “Copa”! O trânsito das grandes cidades, que sempre foi complicado e congestiona nas horas de pico, desde os tempos das carruagens, agora chamam de “mobilidade urbana”. É pra “Copa”! Só porque a FIFA escreveu esse qualificativo da movimentação de pessoas e de veículos pelas ruas das cidades no CSO - Contrato de Subjugação Obsequiosa que países devem assinar se quiserem ter em seu território a Copa do Mundo de Futebol. O Brasil quis e assinou o contrato para aqui realizar esse mundial evento particular, e meteu lá uma garatuja presidencial de aceite. Vale o escrito.
Estádio de futebol é “arena”, imprensa é “mídia”. Diretor de filme cinema medíocre é “cineasta”, escrevinhador de novela de TV, é “dramaturgo”. Ah se Artur Miller, Strindberg, Ibsen, Nelson Rodrigues e o gaúcho Qorpo Santo, entre tantos outros, soubessem disso! Sorte deles não estarem mais aqui ouvindo e lendo tanta bobagem. Bobagem em grande quantidade. Além do “aí” e do “enfim” dos “comentaristas” de TV, os repórteres são quase insuperáveis – só perdem para candidatos em tempos de eleições. Repórteres de TV dizem e redatores da tal de “mídia digital” escrevem coisas como: “sorriso no rosto” – “hemorragia de sangue” – “encarar de frente” – “caminhada a pé” – “pênis masculino” – “próstata do homem” – “gravidez feminina” – “alma humana”; a lista é grande. Publicitários prometem “brindes inteiramente grátis” e políticos ressalvam que o que disseram é “na minha opinião pessoal”.
“Suposto”, “suspeito” e ter e haver no condicional me dá a impressão de que a imprensa não quer se comprometer com a notícia; como se o repórter fosse um apêndice do fato, ou então não tem informação suficiente e certeza do que aconteceu. Um exemplo: “Zé das Couves matou a mulher com 10 facadas na casa deles em Cafundó. O “suspeito” “teria” usado uma “suposta” faca de cozinha.” Outro: “PM reage à tentativa de roubo e mata “suspeito” na zona sul de São Paulo.” Será que basta a tentativa e o suspeito leva bala?
Para encerrar, uma colaboradora da Folha de São Paulo trata de um tal de “discurso estético” da presidente Dilma na ONU dia desses, ajudado pela estampa da roupa dela. É desse jeito: “A roupa que a presidente Dilma usou na ONU pode ser vista de duas formas: pelo viés fashionista de vitrine ou pelo de discurso estético.” E segue descrevendo o “modelito” com “viés” “fashionista”, misturando dois idiomas numa frase certamente imaginando formar uma terceira com algum sentido; coisa de dar coceiras. E conclui a importante matéria que pelo “viés de discurso estético” “falando de guerra, da Palestina e de outras questões complexas, que têm causado banhos de sangue nas últimas décadas, o vermelho foi uma escolha ousada. O que de perto era uma estampa abstrata, algo entre plantas e florais, de certa perspectiva, ou seja, do ponto de vista da plateia, adquiriu um ar de camuflado estilizado. Era como se Dilma fosse um lembrete visual das vítimas dos conflitos enquanto pedia novas medidas e estratégias de ação”. Soube hoje, por Gumercindo, criado guaxo, que Ahmadinejad, Bashar Al Assad, Kim Yong-il, Barack Obama, os Castros,uma penca de Presidentes africanos e outros sacripantas, quando viram o “modelito” e ouviram o chasque de “viés estético” da brazilian president, se borraram de verereda, ali mesmo no auditório da ONU.
Pois saltando da água fervente pro óleo quente, em tempos de eleições, no dito “horário gratuito obrigatório” – como uma sopa de pedra, que é de graça, mas que se é obrigado a engolir - candidatos de primeira urna, não disputam votos, mas, sim, uma corrida pra ver quem diz mais asneiras no menor tempo possível. Os que almejam ser prefeito dividem as asneiras em A e B. Asneiras A: “melhorar (ou avançar) ainda mais” – “disponibilizar no sentido de” – “implantar” – “elevar o nível de” – “construir” – “ampliar”; tudo isso no que se refere à educação, saúde, emprego e renda e, agora, a tal de “mobilidade urbana”. Asneiras B: aqui nesse item estão as promessas que não são atribuições de um prefeito; não são de responsabilidade dos municípios. A lista é tão escandalosa que apenas a questão da segurança pública, uma atribuição do Estado, merece destaque para evitar vômitos ou gargalhadas incontroláveis nos leitores. Um certo candidato a prefeito promete colocar um “xerife”, armado, em cada bairro da cidade. Não digo o nome dele porque não faço propaganda de graça, e nem da cidade; mas ela tem mais de 600 bairros e já passa dos dois milhões e meio de habitantes. Insano que é ainda recomenda e promete incentivar, as pessoas que moram em casas que construam galinheiros e pocilgas para a criação “de galinhas e porcos em seus quintais” para aumentar a renda familiar. Vulpino Argento, o Demente, e nessa eleição candidato a suplente de vereador, diz que esse candidato está “viajando na maionese”. Eu não entendi a observação, mas ele deve saber o que isso significa.
Outro candidato, além das promessas que podem servir para qualquer prefeitura do país, destaca, com cara de quem sabe e pode fazer o que quer, que irá “diminuir o aquecimento global”. Só não disse como irá realizar essa gigantesca tarefa.
A internet ampliou de tal maneira o acesso à informação, (a propósito, não se deveria dizer informação, incluindo aí as toneladas de inutilidades não apenas pelas ditas redes sociais, mas, também, em grande escala, com programas e aplicativos) que pelo computador dá pra sintonizar emissoras de rádio e de televisão ao redor do mundo, além de jornais e de revistas digitais. Assim é possível assistir aos programas eleitorais “obrigatórios e gratuitos” (!!!) pelo Brasil adentro. Pois um desses candidatos a prefeito afirma, fazendo cara de conteúdo, que irá “desenvolver políticas multidimensionais e multissetoriais universais e localizadas.” Caramba!
Outro, menos erudito, mas populista e simplório promete criar “o Bolsa Família Municipal, para complementar a renda dos menos favorecidos.”.
Sobre a questão da segurança pública, cuja falta é um problema e não apenas uma questão, propõe outro candidato: “expansão de investimento público na área social e combate das políticas focalistas, descontínuas, fragmentadas.” Essa tá fácil; só não entendi o “focalista”!
Outro promete “acabar com a falta de médico e medicamentos” e “botar pra funcionar direito todas as escolas do município”. Outra promessa intrigante é de um candidato com 1% de preferência do eleitorado na última pesquisa que irá criar a “Secretaria das Mulheres e dos Idosos.” Não sei o que uma secretaria dessas pode fazer para mulheres (em geral de todas as idades, acredito) e idosos (homens e mulheres, suponho).
È claro que dizer bobagens e asneiras não são privilégios dos nossos políticos. Todavia, assim como as aves que aqui gorjeiam não gorjeiam como as de lá, os nossos são sul americanamente imbatíveis. Mas os políticos são assim mesmo: políticos, em qualquer parte do planeta. Quem esqueceu o conselho que um senador da Alemanha deu ao governo grego no auge da crise econômica na época apenas localizada nas ilhas do mar Egeu? “Eles deveriam vender os monumentos, como o Parthenon, a Acrópole e todos os outros pra arrecadar dinheiro.” Wie Wunderbar!
Romney, o republicano, acha que a capital de Israel é Jerusalém, Reagan, em Brasília, saudou o povo da Colômbia quando andou por aqui.
Os que querem ser vereador são na quase totalidade pessoas sem nenhum preparo colegial; isso mesmo: de colégio, escola, sem estudo, que é como se dizia no passado – o que deveria ser exigido, pelos partidos políticos e por lei, com punição para os que não a cumprisse e comprovasse a aptidão de quem pretendesse legislar para as cidades – e teste de escrúpulo e dignidade também. Pois sendo analfabetos funcionais nivelam e tratam os eleitores de acordo com a própria condição de baixa escolaridade e duvidoso caráter. Esses candidatos, que são contados às baciadas em todos os municípios, concorrem num processo eleitoral diverso dos candidatos as prefeituras, que é majoritário; quem tiver mais votos é eleito. Os vereadores – assim como deputados estaduais e federais – concorrem às vagas num processo proporcional. Uma vigarice político-contábil que permite eleger um candidato apenas com o voto dele.
A maioria dos candidatos não sabe o que faz um vereador e promete “acabar com o serviço militar obrigatório”, “com o absurdo desconto (!) do salário dos aposentados”, e promete também “buscar verbas no BID e em outros bancos internacionais para realizar melhorias nas comunidades carentes”. Por Tupã! Não sabem os limites do que é permitido ao Executivo e o que é atividade do Legislativo. E assim vão tiriricando!
O povo acredita em tudo, vota em qualquer um, elege quaisquer dúzias e depois... esquece. Mas quando são chamados a participar de uma “manifestação espontânea organizada” aplaudem a “presidenta” - que já foi “adolescenta”, “estudanta” e “militanta” - quando diz: “Nós todos temos de ter compromisso com as crianças e os adolescentes, inclusive as próprias crianças e os próprios adolescentes que são agentes também nesse processo, que nós devemos respeitar a opinião, escutá-la e tratá-la com a dignidade que é necessária.”.
O texto é incompreensível porque o discurso foi feito em dilmês pré cabraliano tardio.
Palavras - melhor seria dizer termos - hábitos, usos e costumes mudam ao longo do tempo, é certo. Perdem e ganham outros sentidos e significados, muitas vezes, tão diversos do original que nem os dicionários a elas atribuem o mesmo significado. Mesmo palavras como “verdade” e “mentira” não guardam em si mesmas, para sempre, o mesmo significado, como se sabe. Contudo a mentira, penso eu, não podendo ser verdadeira, não é apenas resultante de uma atitude ou de uma simples expressão da inverdade. A mentira tem um suporte de sustentação inabalável que é a disposição deliberada que um indivíduo tem de enganar – um ou milhares de outros indivíduos - em benefício próprio, de maneira ilegal, desconforme a lei, que não proíbe e não pune o mentiroso pela mentira pura, já que não é proibido mentir; e de maneira imoral, desconforme a pura verdade.
“Um dia, todos terão a 15 minutos de fama”, disse Andy Warhol na década de 1960. Ele se referia as obras que pintava: uma lata de sopa Campbell’s, garrafas de Coca-Cola, retratos de Marilyn Monroe, e não ao que todo mundo entende hoje. Mas que seja. Os minutos do ‘horário político gratuito e obrigatório” disponíveis levam alguns candidatos a fama efêmera. A infâmia, porém, é eterna.
Na TV que os candidatos mentem tanto que chegam a fingir que é verdade a mentira que deveras acreditam ser verdadeira olhando nos olhos dos eleitores, com tamanha disposição deliberada que não percebem estar na frente de um espelho.