HÁBITOS, COSTUMES E INTOLERANCIA
Não muito raro, para não dizer sempre, deparo-me nas redes sociais com opiniões críticas, às vezes ofensivas, aos costumes e hábitos de parte da população desassistida socialmente, uma demonstração de total incapacidade de senso social e de impossibilidade de convívio com as diferenças.
As chibatadas atuais são contra os jovens da classe operária, que sofrem pela ausência do poder publico e ficam fora das escolas, ou quando freqüentam, muitos à noite por estarem trabalhando para compor a renda familiar, são alfabetizados por um ensino fraco e tendencioso.
Não há vagas para todos na escola pública, não há vagas nos hospitais públicos. O hospital geral de Bonsucesso, que é federal, funciona (?) sem gaze e soro. E quem são os usuários desses serviços?
Retornando aos jovens “invisíveis” , é comum e absolutamente sadio e natural que tenham como influencia aquilo que o meio lhes oferece. Jovens, principalmente do subúrbio, consomem musicalmente o estilo definido como “funk”, característico da música negra norte americana assim como o blues, rock.
Os intolerantes de plantão se manifestam ironicamente para desclassificar o comportamento desses jovens quando dividem o espaço público, numa significante demonstração de pseudo-supremacia cultural. Pode parecer exagero, mas isso é um indicativo de segregação social e preconceito.
No facebook li coisas do tipo : “telefone de funkeiro não tem fone de ouvido” uma alusão a quem ouve música em ambiente coletivo sem o uso do acessório. O que convém, a quem se sente incomodado, é comunicar isso a quem o está incomodando, e não fazer apologia à violência contra quem ouve música no alto falante. É difícil, em um país onde não se tem acesso nem a um esparadrapo, acreditar que as pessoas possam compreender as dificuldades do outro. O ambiente coletivo tem regras em comum e precisamos todos respeitá-las e quando acontece de alguém subverter alguma dessas regras, o cidadão mais esclarecido tem por obrigação cidadã advertir sem ofender. Caso não seja capaz de agir educadamente é melhor ficar quieto, pois corre o risco de violar outros códigos e iniciar uma batalha tola.
Em uma sociedade escravocrata os signos lúdicos, que produzem prazer quando da sua execução, são amputados pela necessidade de sobrevivência. Ouvir música é uma das raras diversões desses jovens que manifestam a cultura que lhes impuseram.
Procurei no google alguma coisa sobre “brincadeiras de escravo” e, depois de alguns minutos apareceu: Escravos de Jó. Uma brincadeira de origem, significado e letra controversos. Formada a roda, as crianças permanecem paradas, podendo inclusive ficar sentadas, com um objeto igual para todos , na mão direita. Ao ritmo da música, marcando os tempos fortes, iniciam a brincadeira de passar o objeto que têm na mão direita para o vizinho da direita, e receber com a mão esquerda o objeto do vizinho da esquerda e etc.
Os intolerantes nunca brincaram de Escravos de Jó, e talvez por isso não aceitem receber ou passar nada a outras mãos, ignorando a dura realidade do seu vizinho da direita ou da esquerda.