Ex-crevendo.

Abro o bloco de notas como uma virgem abre as pernas pela primeira vez. Insegura. O que é bem contraditório, já que o motivo por eu não abri-lo e escrever com o prazer e a naturalidade que costumava ter é decorrente da minha prostituição diária de tempo, sanidade e paciência.

Prostituindo vida em troca de simples existência.

Uma virgem de textos.

Cabaça da escrita.

E encurada até o teto pela rola da vida.

Escrevendo como se nunca o tivesse feito antes. Ou como se nada que eu tentasse dizer pudesse de fato expressar o que eu sinto. E convenhamos, não pode mesmo. Nunca pode.

Alguns, os que nasceram pra coisa, usam isso como combustível para escrever mais. Eu uso como fato incontestável de que é uma grande perca de tempo tentar fazer outras pessoas entenderem meus mais obscuros fantasmas, quando eles na verdade são feitos das coisas mais claras e rotineiras da vida.

As menores coisas da vida são as mais destruidoras.

Destroem sem esforço nenhum. E pior, destroem com o meu consentimento.

Usam da tua mão pra socar tua própria cara e dos teus pés pra pisar nos teus castelos, teus sonhos, objetivos ou meras vontadezinhas(que o azar te faz aceitar serem utopias) de experimentação de vida.

Essas coisas que todo mundo tira de letra e que eu preciso enfrentar à base da tremedeira e de palavrões contidos.

Esse confortável caixão aberto que apelidamos de 'rotina', onde os mortos de alma se sentem vivos só por terem um céu pra olhar, mesmo que a terra só livre seus olhos pra apreciar mas nunca tocar naquilo que é bom.

Não fui feita pra isso.

Existir sem viver é como beber água do mar pra matar a sede.

E eu quero água limpa, fresca, cristalina.

Não quero ver se não puder tocar.

Não quero ouvir minha música preferida se não puder dançar descalça até fazer bolhas nos pés e rugas na face de tanto sorrir.

Não quero amar se não for pra me virar do avesso.

E nem colocar no papel o que não consigo expressar com a minha voz.

É mais que escrever. É narrar sentimentos.

É mais que respirar. É viver de fato. E poder errar. Deixar de quebrar promessas que nem foram feitas, inventadas por quem esperou demais de mim. Surpreender quem não esperava nada. Inclusive à mim mesma.

Acabar com a atrofiação dos dedos, que permanece me fazendo a cada linha que escrevo, querer apagar duas.

O nó na garganta continua.

Continua para o que tem que ser dito e se ausenta quando quero pronunciar palavras de destruição de algo promissoramente prazeroso.

O resultado é a mesma mesa farta de arrependimento - e de pãozinho-que-o-diabo-amassou - no café da manhã.

Mais por não ter desistido enquanto era tempo do que não ter tentado.

No fim é sempre mais do mesmo.

E menos de vida.

nes_ste
Enviado por nes_ste em 21/09/2012
Reeditado em 21/09/2012
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