Corrompendo o Mau-Humor
Venho relutando em escrever sobre corrupção. Afinal, é difícil falar com humor dessa praga que empaca o país, reduz nossas chances de crescimento, aumenta as desigualdades sociais, mata de fome, prejudica a educação e a saúde.
George Orwell, crítico ferrenho do regime comunista, disse: "O Poder Corrompe". Referia-se aos temíveis bolcheviques bigodudos e comedores de criancinhas (no sentido antropofágico da palavra), porém, ao escancarar a banda podre do poder legal ou ilegalmente constituído, o autor inglês atingiu todo regime político em qualquer esfera de atuação. E, claro, no Brasil, não é diferente.
Quando os Paralamas do Sucesso cantaram "Luís Inácio avisou: são trezentos picaretas com anel de doutor", foram ingênuos, em dois sentidos. São muito mais do que trezentos e, ainda pior: trazido ao poder, Lula também decepcionou. Talvez, em algum momento, ele estivesse mesmo bem intencionado. Podemos até dizer que algumas melhorias foram implantadas em seu governo. Mas a governabilidade exige alianças e acordos e, muitas vezes, torna-se preciso subverter algumas convicções para que a máquina pública funcione. São muitos interesses, todos apontando para o fato de que o maior poder, dentre o executivo, o legislativo e o judiciário, continua sendo o econômico. Difícil resistir à tentação de usar tanto poder em benefício próprio e, já que todos agem assim, um desviozinho não fará falta ao erário. Acontece que, como diz o ditado, "trair e coçar, é só começar". Um pequeno deslize torna-se um escorregão e daí para uma derrapagem de carreta, basta um mandato.
A gente briga, xinga, esperneia, mas, como um mecanismo de defesa contra essa situação, nossa memória desaparece sempre que nos deparamos com as urnas. Felizmente, a Ficha Limpa foi aprovada. Enquanto não acharem brechas, é uma esperança.
Aliás, a proposta desta coluna ainda é fazer sorrir. Então, quero dar uma boa notícia: hoje, não existe mais corrupção no Brasil! É verdade! Acabou! É que hoje é sexta-feira e as repartições públicas estão todas fechadas.
A má notícia é que, segunda-feira, começa tudo de novo.
Crônica publicada no Jornal Alô Brasília em 16/04/2012, e reeditado do texto homônimo, publicado neste Recanto em 19/09/2008.