A Nova Terra do Nunca
Jorge Linhaça
Quem não se lembra de Peter Pan, o menino que se recusava a crescer, juntamente com seus amigos os meninos perdidos?
Quem já não sonhou em viajar pelos céus ao sabor de pensamentos felizes, coberto de pó de pir-lin-pin-pin?
Quem não se imaginou na Terra do Nunca cruzando espadas com o capitão gancho e seus piratas?
Ah, a saudosa Terra do Nunca, com suas fantasias ingênuas e inofensivas.
Hoje nossos jovens "sonham" com outras viagens, o pó de pir-lin-pin-pin foi substituido por outro tipo de pó, destrutivo, maléfico. Esse pó não se alimenta de pensamentos felizes, pelo contrário, alimenta-se da tristeza, da depressão, do sentimento de inadequação, de inutilidade de cada um de seus usuários.
Hoje o capitão gancho e seus piratas esperam em cada esquina oferecendo seus saquinhos de pó mágico para quem quiser pagar o preço.
O gancho do pirata crava-se profundamente na alma dos incautos, roubando-lhes a alma, a inocência, a juventude e a alegria.
Os sinais de fumaça que vemos não são mais de índios amigos de Peter Pan, são originados da ponta dos baseados que infestam cada beco, cada "lugar secreto" onde são consumidos na falsa ilusão de que "acalmam" ou "relaxam" seus usuários.
Semelhante aos meninos de Peter Pan, esta nova geração de perdidos não encontra as lembranças do amor da família, não porque a família tenha se esquecido deles, mas porque a sua percepção da realidade foi distorcida pelo efeito das drogas.
Os nossos "meninos" da nova "Terra do Nunca" não usam fantasias de ursinhos, ou de guerreiros, seu único acessório é um velho cobertor surrado que, ao invés de fazer as vezes de uma capa de super-herói, como em nossa infância, mais se parece com a mortalha que cobre seu corpo já quase sem vida própria.
Multidões de "meninos perdidos" de todas idades, raças e classes, caminham diariamente na prancha do navio pirata, sendo engolidas pelo crocodilo insaciável da dependência química.
Tic- Tac...Tic-Tac...o relógio marca o tempo na boca do crocodilo...
e a nova Terra do Nunca onde tudo parece andar mais devagar, dispersa da realidade, abraça seus moradores a sussurra-lhe aos ouvidos, qual o corvo de Poe:
Nunca mais....nunca mais...nunca mais.
Nunca mais sairás daqui...nunca mais te salvarás...nunca mais encontrarás o caminho de volta.
Aqueles que conseguem, de alguma maneira, livrar-se da sombria terra do nunca mais, precisam estar em constante estado de alerta para não sucumbir à moderna síndrome de Estocolmo que os faz ainda sentir certa empatia pelos seus opressores, humanos ou não.
Saudades do Peter Pan, hoje substituído pelos Peters pó na vida das crianças.
Não deixe um traficante adotar o seu filho!