Os velhos festivais de MPB... (EC)

Sou contemporâneo de alguns ‘conterrâneos’ baianos que aportaram por São Paulo nos anos 60, à época dos festivais de música veiculados com maior sucesso pela rede Record de televisão de São Paulo. Juntamente com demais jovens que despontavam no meio musical e que entoavam canções que ensejavam uma nova linha poética em termos de composição, formavam quase imbatíveis concorrentes aos títulos e premiações que alimentavam o show business!

Unindo aos sons diversos que uniam violão, reco-reco, gaita, sanfona, berrante, bateria, sax, clarinete, violoncelo ousaram introduzindo guitarras elétricas que causaram, no inicio, muita consternação e reclamações dos tradicionalistas que não admitiam algo que ‘vinha de fora’ fazendo parte das músicas ditas genuinamente brasileira!

Uma das mais memoráveis disputas destes festivais ocorreu precisamente em 1967, quando os citados jovens aliaram suas letras rebuscadas e interpretações ousadas com conjuntos da época, cabeludos e contestadores que tinham mais em sua linha melódica o rock que permeava a juventude, embalada no sucesso dos Beatles e da jovem guarda, comandada por Roberto Carlos coadjuvado por Wanderléia e Erasmo Carlos!

O então jovem Gilberto Gil inscreveu a música Domingo no Parque, que contava uma história passional com desfecho trágico, envolvendo dois amigos apaixonados por uma mesma moçoila. Ao seu lado, uma também jovem Rita Lee ‘vocalizava e liderava’ uma banda denominada OS MUTANTES, que na guitarra base e no contrabaixo contava com dois ‘cabeludos’ irmãos. E a letra, de fácil recepção e gravação pelo público, entoava juntamente com a voz vibrante do compositor: “ O rei da brincadeira, ê José... o rei da confusão, ê João... um trabalhava na feira, ê José, o outro na construção, ê João... “. Aplaudidíssima, a composição foi a vice-campeã!

O jovem Edu Lobo, com interpretação brilhante da intérprete Marília Medalha, concorreu com uma inspiradíssima letra e música chamada PONTEIO, que fez com que o público em meio a gritos de ‘já ganhou’, também acompanhasse o entusiasmo dos intérpretes, principalmente no entoar do interpretativo refrão: “ Quem me dera agora eu tivesse a viola prá cantar... Ponteio! “. E, para delírio ‘quase geral’ do público que praticamente anteviu a vitória, foi a grande campeã da noite!

O inspirado jovem Chico Buarque de Hollanda, que contou com ‘auxílio’ do conjunto MPB-4 na interpretação, concorreu com RODA VIVA, onde o contracanto de vozes deu a tônica de qualidade à interpretação. O público delirava quanto era entoado: “ Roda mundo, roda gigante... roda moinho, roda pião... o tempo rodou num instante... nas voltas do meu coração! “. Detalhe para o exato momento do contracanto executado pelos excelentes intérpretes do conjunto MPB-4. E a terceira colocação colocou definitivamente o então jovem compositor na trilha do seu exuberante sucesso.

Com o desfilar de jovens que caíram nas graças do público que se dividia em suas preferências, alguns que não conseguiam ‘cair nas graças’ do público, em sua grande maioria jovens ditos politizados, por vezes nãos conseguindo dar um bom segmento às suas interpretações. Isso levou o também ainda jovem Sérgio Ricardo, que não conseguiu levar a um bom termo a interpretação de sua concorrente BETO BOM DE BOLA!, a um total ‘destempero’ que o fez, literalmente, quebrar seu violão e atirar sobre o público que o vaiava de maneira impiedosa, para desespero do fleumático casal Blota Júnior e Sonia Ribeiro, que comandavam o espetáculo.

E até o chamado “rei da juventude’, Roberto Carlos defendeu uma composição de Luis Carlos Paraná intitulada MARIA, CARNAVAL E CINZAS, conquistando uma 5ª colocação...

E um dos corolários deste festival, foi a interpretação dada pelo jovem Caetano Veloso, que contou com participação de cabeludos músicos argentinos, componentes do conjunto BEAT BOYS... Na inspirada letra desta sua canção, que acabou transformando-se na mola mestra de sua vencedora carreira posterior, havia um sucinto relato da epopéia vivida pelo artista quando resolveu abandonar suas paragens em busca de oportunidades maiores no âmbito musical, aportando logo de inicio em SAMPA. Logo no inicio da composição, poeticamente a composição alegava: “ Caminhando contra o vento, sem lenço nem documento, no sol de quase dezembro, eu vou... “.

Declaração explícita do compositor que ao chegar em terras estranhas, encontrava-se como se perdido, em meio à selva de pedra, tentando adaptar-se à sua nova situação.

E sua composição ALEGRIA, ALEGRIA! conquistou a quarta posição na competição, porém, foi um tremendo sucesso de crítica e de público, até superando as composições que a antecederam em termos de premiação!

Este texto faz parte do Exercício Criativo - Sem Lenço Nem Documento

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HICS
Enviado por HICS em 17/09/2012
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