DNA - Eu
Toda a vez que entro no laboratório para coletar sangue, lembro porque detesto fazer isso.
As paredes brancas e a essência etílica do ambiente me dão náuseas. Ali há doentes, células, xixí e merda armazenada em potinhos. Não gosto não.
Ao meu lado uma mulher treme, do outro uma criança berra... céus!
Essa é a hora em que começo a ficar nervosa.
Não é a agulha. O sangue, a dor, não é nada disso. Como disse, é o teor do éter, a falta de cor dos recintos, o cheiro exacerbado de saúde.
Agulha descartável, mãos suando.
Nem vejo. Me sento na cadeira e já cubro os olhos com as mãos. O elástico na parte superior do braço me aperta os músculos como carne em açougue. Então as veias se espremem e são desviadas para três pequenos tubos de acrílico – ou vidro?
Em geral, nada sai. A pressão cai e fica tudo bem dentro de mim. Sabendo do desespero que sinto, parece que meu próprio sangue quer me aliviar: eu não vou a lugar nenhum, "podexá."
Depois de indelicadas insistências alheias, o líquido vermelho sempre acaba enchendo as ampolas, junto com meu Ferro, meu Cálcio, meu medo, meus sonhos, meu Eu – tudo o que juntei por anos em forma de hemoglobina, direto pra moça simpática de jaleco, que eu nem sei quem é.
Aí eu fico ainda pior.Suor nas extremidades, a força do elástico ainda mais aparente. Verdadeiros minutos de pavor e frio.
Ontem, mais um dia, de laboratório.
- Abre e fecha a mão, senhora.
Comecei o movimento indicado e representado pela enfermeira à minha frente. Abre e fecha, abre e fecha, abre e fecha...
Tentei me manter calma enquanto meus olhos já pousavam dentro das palmas da mão e a agulha dentro de mim.
Só mais um pouquinho e pronto! Viu? Doeu?
Não. Hoje não doeu.
Saí do laboratório, peguei minha bolsa, meu sonhos e fui embora.
Retomei meus pensamentos sadios, minha respiração e pensei como é bom viver.
(15/09/12)