Festim diabólico

A festa terminou, as luzes se apagam e o salão está quase vazio. Sentado no trono com uma cara de extrema alegria se encontra o novo rei, não houve guerra ou qualquer assassinato, apenas a vontade unânime e sábia do povo (como diria Nelson Rodrigues!). Ele (ou ela, afinal o poder assim como os anjos não tem sexo!) foi eleito por suas qualidades, idéias inovadoras e grande responsabilidade social.

Nos próximos anos esta figura fará tudo o que estiver a seu alcance para honrar seus compromissos com aqueles que o levaram ao poder, levará segurança e melhores condições de vida as periferias brasileiras (Jardins, Copacabana, Lago Sul, Angra dos Reis, etc.), todos os brasileiros humildes terão voz (Magalhães, Batistas, Bulhões...), inocentes serão justiçados (Cacciola, Maluf, Roriz...), a estrada do futuro será pavimentada (mais um pouco de sangue e ossos).

A figura imponente agora chamada governante observa o salão quase vazio e pensa em seus domínios, tanto poder e glória (por um preço tão pequeno), apenas uma alma por milhões de servos! Pensa em sua trajetória, suas lutas, conquistas, as alianças (o diabo não é tão feio como pintam), as mentiras (nunca mentiu, disse apenas o que queriam ouvir!), vindo do povo e alçado ao poder é o símbolo da força igualitária da democracia.

Sente pelo corpo um calor e uma dormência, o sono se aproxima, não deseja que a festa termine ou que a noite tenha fim, quer gozar todas as sensações que este momento único lhe traz. Observa pelo canto dos olhos já quase fechados uma sombra que se arrasta recolhendo as sobras e os restos do seu festim, do fundo da memória e com muito esforço vem uma luz de reconhecimento, é o “povo” (afinal ele também tem direito a participar da festa), dorme em paz, pois se sente justo e nobre.