A natureza não as fez mudas
         
          Ao presenciar certas coisas, minha avó Fina, então ignorando que a “energia escura” explicaria o ameaçante cataclismo escatológico, vaticinava: “ - É o fim do mundo”, a que tia Dulce retrucava: ” - Isso é gente sem religião”... Lembrei-me desses sinais dos tempos, ao ver quatro belas jovens, numa mesa redonda de um restaurante, conversando sem dizerem uma palavra; nada de sobrenatural: caladas pelo iphone, dedilhavam conversa entre si, sentadas uma ao lado da outra, provocando ora sorrisos, ora gargalhadas ou fisionomias de constrangimento. Mal pressentiam que o garção passava pela terceira vez, estendendo-lhes o cardápio.

          Dia seguinte, descrevi a um amigo que caminhava no calçadão da praia o que acontecera. Ele, sincero, confessou que, na sua casa, surpreendeu-se fazendo o mesmo com seus dois filhos e a mulher: cada um num “tablet”, provando do milagre da tecnologia o que não conseguiam há tempo: conversar em família. De repente, tomado de vergonha, desligou os aparelhos e reuniu-se no jardim para, com a família, refletir sobre aquele artificial comportamento.

          Ao ver jovem ou adulto entretido com “mensagens” desnecessárias ou “flips”, fechando boca e ouvidos aos que estão ao seu redor, comparo tal comportamento ao de Zeca de Tonho Sapateiro que, em 1957, viajara a São Paulo “para arrumar um trabalho” e, quando voltou, trouxe um rádio de pilha do tamanho de uma caixa de sapato, mostrando, nas praças de Itabaiana, que seu rádio não tinha fio; falava e cantava onde ele quisesse, com pilha e não com bateria de carro como o da fazenda de “Seu Maroja”.  Nos anos 60, em João Pessoa, não diferentemente, “filhinhos de papai” de razoável poder aquisitivo passeavam na Lagoa com radinhos de pilha em capas de couro, exibindo esses miúdos transistores japoneses.  Essas “breguices” duram até que tais objetos exibíveis se tornem populares. Era assim carro para “passear na rua”; depois, carro do ano, usado sem placa até o guarda ameaçá-lo de multa ou com plásticos nos assentos até piorar, por esquentação, eventual hemorroida.  Não sei que doenças virão desses “brinquedos” da internet, mas, com o tempo, trarão doenças psicossociais, também de vista, ouvido, coluna, quem sabe câncer ou malefícios como a perda da palavra escrita já atrofiada em e-mail e que, assim em “diálogo virtual”, deixará de ser falada. Contudo, não será pela natureza que nossas crianças perderão a oralidade e far-se-ão mudas...