DOZE ANOS

- Você ainda está em casa?

- Esperando você.

- Pois abre a porta.

Ele foi abrir a porta, mas antes correu para olhar-se no espelho. Estava bem, achava. Vestiu uma camiseta, passou as mãos para arrumar o cabelo e voltou para a sala.

Quando a abriu a porta, ele a encontrou reclinada na parede. Um sorriso entre tímido e nervoso surgiu, quando ela disse "boa noite".

- Entra, foi a única coisa que ele conseguiu dizer, depois de olhá-la por um tempo que lhe pareceu um século, mas sua preocupação não deixou que passasse de alguns segundos.

Estava linda, ele achou. Agora, já dentro do apartamento, com a porta fechada, dava para olhá-la melhor. Mudara um pouco. Engordara alguma coisa, mas conservava ainda a silhueta de doze anos atrás, quando se conheceram numa noite em que ele, por acidente, perdeu o ônibus e teve que permanecer na parada para esperar um outro de meia hora depois.

- Doze anos! Ela disse com os olhos fitos nele. Você mudou um pouco desde...

- Desde a última vez que nos vimos, antes do seu casamento, ele emendou a frase porque teve certeza de que, para ela, seria muito custo fazer.

- É, desde aquele dia.

- E como estão vocês?

'Vocês' eram ela, o marido e o filhinho, que agora já ia para os nove anos.

- Bem, bem. O Paulo já terminou o curso e o Max tá entrando amanhã de férias. Ela puxou a cadeira que ele indicou. Sentaram-se. Um silêncio de aço tomou conta do lugar, que parecia àquela hora o único do mundo, parecia um espaço suspenso no nada.

- E você, está bem aqui? Gostei deste lugar...

- Ele parece com você.

- É, ele tem algumas coisas que parecem minhas.

Ela olhava para os quadros na parede, para as fotos, para os trecos amontoados na estante... ele olhava para ela, tentava buscar nela todos os sentimentos que um dia explodiram e que jamais se extinguiram. Estavam velados, apenas velados. Mas ele jamais lhe diria isso novamente. A idade, as situações e o tempo vão mudando e transformando explosão em prudência.

- Você me fez muito bem, e sinto que eu também lhe fiz. Foi o que de mais reminiscente ele conseguiu dizer quando ela olhou o relógio e levantou-se para sair. Ele não tentou retê-la. Fez sim com a cabeça quando ela disse 'minha hora', abriu a porta e disse isso, com os olhos nela.

- Vê se não some de novo, foi difícil achar você. Essa cidade já não é mais um ovo, viu?

- Você me achou. Me acha de novo.

Depois de deixar nele um gosto de espanto, ela desceu as escadas. Ele recostou-se na parede e ouviu, por horas a fio, a música que repetia incessantemente no som, e que fazia mais presente aquela ausência.

Marcos Fábio
Enviado por Marcos Fábio em 12/09/2012
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