Dois irmãos e dois destinos

Causo interessante é o de Jorge no Rio de Janeiro. E quem é Jorge? Ah, detesto isto de dizer MEU MARIDO, mas ele é o próprio. E por que não gosta? Porque penso que “Ninguém é de ninguém e na vida tudo passa”. Jorge é um interiorano, de Aquidabã, município do sertão sergipano. A casa onde nasceu era situada na praça que, lá, está por detrás da igreja matriz. Daí o leitor faça uma ideia, uma igreja matriz que tem a praça nos fundos. Quando quero azucrinar a paciência de Jorge, eu digo que a terra dele é pelo avesso. Alô, pessoal de Aquidabã, eu amo a terra de vocês, mas sabe como é isto de mulher querer atanazar marido. Ainda no início da adolescência, a família de Jorge veio morar em Aracaju. O tempo passou, a adolescência estava pela metade e o personagem principal desta crônica viajou, junto com o irmão mais velho, para o Rio de Janeiro onde viveram com os tios paternos e primos. Lá começaram a trabalhar. E também a se esbaldar, a namorar e a aproveitar das praias cariocas. O irmão mais velho, mais avançado, mais ambicioso, logo se ambientou e até adquiriu o sotaque carioca. Jorge, mais apegado aos costumes familiares, ao carinho dos pais e da única irmã, ficava meio nostálgico, saudoso, e falava a fala inocente daqueles que se criaram entre cabras, bois, galinhas e engenhos de açúcar. O irmão, diferente, metido a sofisticado, seguia incentivando, elogiando as vantagens da cidade maravilhosa. Organizava passeios, chamava carioquinhas, iam aos lugares mais bonitos. E Jorge entristecendo, murchando, perdendo o apetite. Ele que comia cuscuz com leite e requeijão no café da manhã e, aos domingos, pirão de capão. Os tios e a avó preocupados. De Aracaju sempre pediam as notícias. Um belo dia, aliás, uma bela noite carioca, Jorge saiu para as boates e sentou e bebeu em todos os bares por onde andou. Dessa vez não foi com o irmão. Amanheceu o dia na praia, nas areias de Copacabana, enquanto os parentes se desesperavam e até procuraram uma delegacia. Nada de Jorge. Voltou pra casa quando bem quis e levou uma surra de cinturão do mano mandão, do chefe. Vou embora deste lugar, não quero ficar mais aqui, quero ir pra casa. E chorava feito criança. O irmão queria bater mais naquele farrista nostálgico, foi uma confusão danada, telefonemas pra Aracaju. Ai, meu Deus, que será que deu no meu filho? Passou a noite seguinte acordado o rapaz saudoso, decidido estava e trancou a porta do quarto com um objetivo a alcançar. Arrumou a mala de qualquer jeito, embolou tudo, misturou roupas com sapatos e o que mais lhe pertencia. Foi o sol piscar o louro olho e o galeguinho de Aquidabã saiu com a mala na cabeça. Era uma daquelas malas em couro, com tiras e fivelas exteriores para fechar. Uma manga de camisa ficava de fora parecendo o lenço branco da partida a acenar para o Rio de Janeiro toda vida lindo. Faltava o irmão. Sim, o poderoso chefão. Lá vinha ele de venta acesa e gritava VOCÊ NÃO VAI. E agitava no ar o cinturão de dar lapadas em irmão cheio de vontade. Jorge jogou a mala no chão e fazendo punhos de boxeador, dizia VENHA QUE EU TE QUEBRO. Mandão, mas franzino, sem muques, o chefe recuou e o sertanejo voltou para a querida Aracaju onde vive. O irmão agora é só uma enorme saudade.