PELA "PARADA BRANCA" DA AVENIDA BRASIL

De peito aberto...lá dum tempo "verde-amarelo":

Aqui, enquanto eu lia uma crônica das reminiscências cívicas dum escritor "O último dia Sete de Setembro", repassava na minha memória toda a época da então escola básica, a que corresponderia ao ensino fundamental dos dias de hoje, tempo em que aguardar o desfile do "sete de Setembro" era motivo de orgulho e de muita expectativa entre nós, alunos.

Quase um mês antes eu já sonhava com os preparativos daquela festa que para mim era de suma importância, principalmente os ensaios da fanfarra, (lembram dela?-hoje temos os "fãs das farras"!)) que começavam com muita antecedência porque naquela época os ritmos não poderiam desandar...

Eu carregava um bumbo maior que eu, (naquela época nada era menor que eu, o mundo me parecia grande demais!) todavia, a cada soada da marcação "forte e firme" era como se o meu coração se amalgamasse ao trepidante entusiasmo pelo meu "chão de apoio", pela minha Pátria tão querida.

Quando somos muito jovens, alguns desconhecimentos ainda não esclarecidos pelos livros da vida , aqueles que nos narram a História real vívida, sempre nos fazem mais iludidos frente a tantos ilusionistas que ainda nos desfilariam pelas paradas dos tempos, por tantos diversos caminhos.

Como era bom sonhar com o futuro!

Naquela minha época, as exigências da escola eram incontestáveis: no dia da Pátria, tudo tinha que brilhar e sair perfeito.

Seria inadmissível, por exemplo, que um aluno se apresentasse com "ares desmazelados" para o cumprimento do seu dever cívico.

Eu, temerosa que era de ser disciplinarmente chamada à atenção pelo sempre "politicamente correto", já colocava na semana anterior, sobre a minha cama, alguns itens do uniforme impecavelmente cuidados: as meias soquetes, o sapato "tipo boneca" engraxado pelo meu pai, (certa vez, para um desfile cívico, ganhei um par de verniz preto, feito a mão, que me encantou os olhos) o uniforme semi- engomado pela minha mãe, aonde o logotipo da escola e o colarinho da camisa branca se destacavam em "marcatto", e o que mais me encantava: a fita branca que enlaçaria meu vasto cabelo preso a um rabo de cavalo caprichosamente trançado. Meu irmão, mais novo que eu, nem poderia chegar perto dos meus apetrechos sagrados.

Eu me lembro que semanas antes eu já passava ali numa lojinha simples do meu bairro e com algumas moedas que tirava do meu "porquinho" eu comprava, ( "por metro bem medido!"- a repetir o pedido da minha mãe), a fita larga de cetim branco, acetinada de ambos os lados, que também levaria uma goma para realçar o meu laçarote.

Mas eu sabia que a vendedora, uma já frágil senhorinha de nome ANGELA, sempre me agraciava com alguns centímetros a mais: nunca me esqueci daquele seu ato "escondido" de altruísmo patriótico.

Eis que chegava o grande dia:

Desfilar pela avenida, junto às demais tão impecáveis escolas, em nome da minha ESCOLA PÚBLICA, a homenagear a minha Pátria, solo no qual se desenrolaria a minha vida cidadã, de fato, aqui nas minhas letras, é duma emoção inenarrável.

A cada "bumbada" era como compactuar com a forte convicção de que, ao andar para a frente, a cada passo daquela avenida, eu e todos aqueles meus amiguinhos compatriotas faríamos algo pelo nosso país que até então tudo procurava fazer por nós: hoje sei que a formação educacional que recebi nos primórdios da minha infância, naquele tempo em que o professor era tido como ilustre instrumento fundamental no destino dum país, ao menos nos preparou para enxergar o entorno com acuidade e claro discernimento.

Hoje, todavia, desfilo por paradas sociais, em avenidas dum realismo também aqui inenarrável, aonde sinto que os antigos carregadores dos "bumbos" hoje se traduzem nos trabalhadores que verdadeiramente carregam "os pianos" pelo país.

Deve ser o que chamam atualmente de Avenida Brasil.

São outros os tempos, obviamente que são.

Todavia, se os valores mudaram em tão pouco tempo, por todas as vias, o caminho ético é algo pétreo, virtude cujo estímulo há que se trabalhar bem cedo nas crianças: a desenvolver algo intrínseco, legítimo, como são todas as fidedignas expressões dum código de DNA.

Assim, quando traslado aquele meu tempo cívico para as "avenidas-brasis" atuais, tão surreais, penso que soar fortemente o bumbo pela minha fanfarra da infância me norteou a bater o martelo no meu atual e constante dia- a- dia, pelas minhas mais fortes convicções, a maior delas: a de que algo urgentemente precisa ser feito pelo todo, precisamos retomar as atuais avenidas das paradas tão desnorteadas da nossa Pátria idolatrada.

De fita branca, termino aqui meu perene desfile pelo SETE DE SETEMBRO, este presente dia histórico que para mim é TODO E QUALQUER DIA, dia após dia de luta muda pela atual e tão sofrida cidadania brasileira.

Salve Salve, por um Brasil eticamente livre!