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FOGO CRIMINOSO NAS FAVELAS?
FOGO CRIMINOSO NAS FAVELAS?
Temos visto com frequência uma sucessão de incêndios nas favelas dos grandes centros urbanos. Rio e, com maior força, São Paulo, estas urbes são o epicentro de tão lamentáveis ocorrências.
A gente abre a televisão e lá está uma inteira comunidade virando fogaréu e cinzas. Ora, uma criança fumando crack, ali na esquina, e um homem exangue de fome, estendido no asfalto, tudo isto representa drama social; mas uma favela pegando fogo é uma desgraça enorme, uma tragédia inominável.
Lá, em barracos que se apertam uns aos outros, amoitam-se, fazendo de conta que são moradores, centenas e milhares de almas, inclusive menores drogados, assaltantes e adultos famintos. Só que, também, existem centenas e centenas de pessoas boas, pacíficas e trabalhadoras.
Ao longo de anos, décadas e décadas, maus governantes – sem planejamento nenhum, na messe do urbanismo – deixaram criminosamente que gentes entre gentes virassem um gado humano abandonado nos currais e bolsões da miséria.
E as moradias simples, toscas, à base de pau a pique, sapé, lona, papelão e madeira velha e incendiária formassem o cenário de futuras tragédias, por meio de incêndios inevitáveis.
Fico de orelha em pé, quando tais tragédias acontecem com a maior frequência. Como e por que razão tantas comunidades pobres pegam fogo? Uma atrás da outra se carboniza, todos veem isto que falo, agora, na mídia televisiva.
Haveria uma indústria dos incêndios, com o fim único e exclusivo de desalojar milhares de pessoas das zonas ditas «nobres»? Ou será que essas zonas subumanas estariam, em breve, a ponto de receber o pomposo batismo da exploração imobiliária?
Sei não!... Cheira muito mal esse rosário de fogaréus nos chamados guetos da sociedade. De uma ninguém me remove: tudo por conta da irresponsabilidade de maus gestores da res publica, perpetuados no poder e que só desejam locupletar-se de vantagens e bens e riquezas, muitas das quais à custa de expedientes escusos e descalabros na velha política do tudo venha-mais a mim e aos meus.
Na favela, em qualquer cidade que for, existem também pessoas dignas, honestas, que emigraram de distantes rincões e lá construíram sua família, juntaram seus trenzinhos simples, enfim, toda uma vida ali acumulada.
Um rádio, o televisor, em algumas casinhas a geladeira, o sofá, a mesa, o som de os meninos apreciarem as músicas do funk, e por aí vai. Infeliz e lamentavelmente, sob a gulodice dos incêndios, propositais ou não, tudo foi transformado em espigões de fumaça e, depois, lá onde fora a comunidade, agora é só o cinzeiro.
Não posso ver tudo isso sem que não me doa n’alma a antevisão do inferno que se vai esbanjar também na alma dos sobreviventes. E quando há mortos, às vezes velhos, mulheres e crianças, ou até bichinhos domésticos?
Vocês não viram, outro dia, após incêndio, no Rio, um colecionador de telas de famosos, em Copacabana, lamentando não os quadros raríssimos e valiosos de artistas como Di Cavalcanti, Anita Malfatti e outros titãs da pintura, tudo incinerado no apartamento, mas lamentando com água nos olhos a morte de um gato de estimação? INDIZÍVEL é o apego que se tem, ou se pode ter, às pessoas e aos animais.
As obras de arte dos habitantes da favela são os filhos miúdos, os bichinhos de casa – aves, gatos e cães – e os teréns, em geral, todos perdidos após a tragédia de um incêndio.
Sei não!... Mas há quem afirme que o rosário de incêndios nas favelas é criminoso, fogo ateado de propósito a fim de tanger para bem longe os pobres entes que lá foram vitimados.
Fort., 03/09/2012.