Educação em pauta

Aqui no sul o jornalão está tratando do assunto “educação” com misto de devoção e espanto. Tratam sempre da educação como fenômeno diferenciado, do tipo que deve ocupar sempre manchetes ao sabor dos fatos excepcionais. A educação deixou de ser referência intelectual. Está longe de ser trabalho intelectual. O jornalista e o jornal passaram a ocupar essa referência. No caso a imprensa produziu com grande equipe (coisa que professor não tem) boa edição, com várias páginas abordando o tema, estão os articulistas com o dedinho indicador levantado, para apoiar a educação. Será sempre imprensa sem paradoxos internos.

Ninguém mencionará na própria edição o papel dos meios de comunicação dentro desse desastroso processo em que se produziu uma educação vazia, morta de sentido tecnológico que é inteiramente voltado para a auto-suficiência e o autodidatismo notável. Quem quer um professor tendo computador, olhando o noticiário, passando os olhos nas notícias de escândalo do jornal? Seria contraditório ir de encontro ao próprio umbigo na abordagem do tema. Em sala de aula sabemos o quanto esses conjuntos de informações, mercantilizadas pelos anunciantes, esbanjam mediocridade com o fino propósito de vender produtos. Só agora estão questionando o veneno da indústria química dentro dos frascos coloridos vendidos como maravilhas pelos senhores da mídia. Grandes mentiras como o fino sabor em pó da fruta natural. O ser humano mente como diria o House.

Educação não é prioridade. Nunca foi em nenhum aspecto histórico da sociedade nacional. O importante é agradar as massas, por isso temos mais estádios que hospitais e escolas. Estamos aprisionados apenas na preparação de certo grau de conhecimento para o bom convívio nas relações de trabalho.

O professor perdeu a autoridade em sala de aula porque prepara almas para uma competição originalmente injusta, que no fim, se bem moldada, sofrerá a rasteira do poder pessoal, golpe de sorte ou cotas inseridas num problema de todos. Do contrário jogamos o conhecimento na espiritualidade ridícula em que se convertem os pobres primeiros leitores de superfície da realidade no que tange a compreensão inaparente. O próprio jornalismo descambou para textos insipientes, prontos para agradar até o leitor analfabeto. Ocorre então certa “analfabetização” do leitor pelo modo prático. Razão pelo quais os cartunistas são detestados em seu ofício de fazer pensar com mais poder do que a palavra simplesmente escrita. A interpretação complexa do mundo é matéria desprezível. O tempo arquitetou a troca do erudito fastidioso para o jornalista de carimbo do fato. Tudo parece claro, nunca profundamente esclarecido porque tem pela frente o mundo jurídico ao seu encalço. Isso a imprensa não discutirá de modo algum.

A educação também passou pelo mesmo processo. Do erudito barroco insuportável, macarrônico para o professor chinfrim, destinado a ser uma “supernanny” – clássico da televisão britânica, que ajuda os pais a superar a baderna horripilante das crianças. A educação antes deve ser discutida sob o ponto de vista da insalubridade psicológica e auditiva. Vinte ou quarenta crianças indisciplinadas representam o que chamamos de bulingue para o professor, mas todas as teses de “bullyng” são para cuidar dos indisciplinados alunos em sua canalha covardia grupal. Ninguém atribui esses fatos a sérios complicadores da saúde. O saudoso Moacir Scliar abordaria decerto este aspecto para o jornalão clássico pelo seu elo entre medicina e conhecimento. Falta que faz.

Sem falar na arquitetura egoísta em que vivemos dentro ou fora da sala de aula. Sem comentar a inclinação dos teóricos em alicerçar visões de padrões da economia social como base para estudo da indisciplina nas escolas. Como se o péssimo aproveitamento escolar fosse problema de pobres, periféricos e demais filhos do lumpemproletariado. Na verdade é questão inicial da infância em suas distorções no que diz respeito à formação emocional da criança. Diplomacia e psicanálise deviam ser incorporadas à educação primária fundamental. Qualquer novo plano educacional deveria lembrar o quanto vivemos uma época sem referência para relacionamento interpessoal, nossas relações estão sendo conduzidas por valores segmentados da mídia de consumo. Tudo o que temos é a confusão televisiva de valores para expectadores hipnotizáveis pelo farto conteúdo irreflexivo.

Professor não é mais intelectual. Ele é herói sem autoridade que vai para sala de aula conter a selvageria infantil. Enfrenta crianças que pretendem demolir qualquer sentido de autoridade e respeito porque esse processo não lhes garantirá com certeza um final feliz. O aluno sente que é forçado a pensar como um escravo. Como um escravo pensaria aproveitar cada minuto de alegria e expansão de suas vidas miseráveis devido ao futuro incerto a anarquia brinda os soldados de Spartacus. Até a síntese do lucro vem superfaturada na segunda assertiva: incerteza e risco. Poderia ser: educação, certeza e lucro. Mas não. Portanto nosso humanismo depende absolutamente do caráter natural dos alunos como o barco a vela do vento, diante desse grande desmantelamento do sentimento educacional. Desprezamos a inteligência como os meios de comunicação alinham-se ao conteúdo mais rasteiro diante de problemas mais complexos.

Nesse período eleitoral todos os demagogos estão de plantão com a palavra educação na boca cheia de dentes e promessas. O problema da educação sempre foi mais caro a sociedade do que o problema das drogas, mas a imprensa preferiu apoiar a “guerra armada” contra as drogas do que apostar na educação. Que educação há numa guerra contra as drogas? Patrocinar o repudio ao drogado como se fossem leprosos nos tempos bíblicos? Puro ciúme quanto ao lucro que lhes parece fácil? Quanto material químico inapropriado jorrou no sangue cancerígeno através do consumo fartamente incentivado pela mídia competitiva? O que temos é a educação obscurecida para nunca ler, mas sim aceitar todos os pontos de vista pelo crédito dado ao meio. O que leva até as crianças do ensino fundamental a suspeitar através da rejeição essa regra em suas vidas infantis. E infantis permanecerão até o fim da sua exploração num berro de gol.

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