AUTOCRÔNICA (cotidiano)

Um dia desses sentei-me pra beber comigo. Pablo e Pablo. Olhos nos olhos. Dois copos de bebida. Duas carteiras de cigarro.

Estava de mau humor, e repreendi o Pablo severamente. Esfreguei nas suas ventas as suas fraquezas, os seus erros, a sua mediocridade.

Ele acovardou-se, calado, cabisbaixo. Timidamente, argumentou que nunca teve intenção de estragar as coisas; que seu coração é bom; que quis acertar, mas falhou…

Retruquei que intenção não basta, que ele teve mil chances e as desperdiçou, e que bebeu muito, gostou de mulher em excesso e vagabundeou demais!

Já com lágrimas nos olhos, ele disse que era difícil ouvir aquilo tudo, que seu coração estava despedaçado. Disse que um dia acreditou que aquele era o caminho pra amizade, pro amor, pro proveito do tempo; mas que via, agora, a droga em que tudo deu, pois estava sozinho, triste, inerte, enxovalhado.

Fui mais além, e falei de tudo o quanto ele poderia ter sido, e não foi. E que era tarde. Que seu destino estava traçado: “Pablo, disse eu, você foi um baita burro!”

Ele juntou as duas mãos e as enlaçou, e elas tremiam e, feitas em concha, ele deitou sobre elas a cabeça e chorou até a vermelhidão, lágrimas abundantes, soluços sentidos, arrependimento sincero. Quando isso aconteceu, quando o vi daquele jeito, deu-me uma melancolia, meu coração cresceu, meu queixo tremeu-se todo!

Olhei-o, ali, o pobrezinho: meu querido Pablo, meu doce Pablo, meu Pablo sofrido… Amo-o tanto!

Acolhi-o feito um bebê, e juntei suas lamúrias em meus braços, em meu peito confiante. Alisei seus cabelos, beijei sua cabeça e disse: “Calma, Pablito… Me desculpa. Vamos recomeçar, tá legal? Você ainda pode!”

Mas, cá pra nós, acho que o Pablo é um caso perdido…

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