O MITO DA IMORTALIDADE
Lembrei que, em determinados momentos da minha vida, dei razão a Vinícius quando disse "filhos, melhor não tê-los", contrariando o instinto natural e não questionado da manutenção da espécie. Da manutenção do conjunto genético. Da fantasia de viver depois da morte.
Dois pensamentos primitivos que acompanham o homem ao longo de sua existência desde que tomou consciência da vida e de sua finitude: o mito do Éden, com a volta a ele, e o mito da eternidade.
Engajado nestes mitos, divido-me entre o prazer e a dor.
Cada vez que tento voltar ao Éden (útero materno), contento-me com o meio do caminho que é o colo do útero e despejo meu prazer, delegando a algum espermatozóide a façanha que me é impossível. Ainda que isto me console, não nego a frustração do fracasso na tentativa instigada pelo meu ser primitivo.
Com o tempo, no entanto, a intensidade do prazer, na caminhada em busca do paraíso perdido, acaba por compensar a frustração e me faz aceitar que o retorno a ele é impossível.
Mas e a eternidade? Ah! esta é possível. Ela está ali, em cada um dos meus filhos, que a transmitirão por gerações incontáveis.
Assim é que, a par das coisas inexplicáveis dos sentimentos que a natureza houve por bem nos dotar, perder um filho é como perder um pouco da imortalidade.
E não há dor maior do que perder o que nos é mais caro.
Tanto que proliferam, de forma absurda, religiões baseadas neste mito da imortalidade.
Estávamos ali, na ante-sala da capela mortuária, a relembrar tragédias. Cada um resgatava lembranças de fatos a projetar dores semelhantes às que estávamos vivenciando. No caixão branco, coberto de flores, o pálido rosto de um menino de nove anos. Tal qual os nove anos de nossos filhos.
Abraçara o pai sem nada ter a dizer. Apertei-o no peito, escutei o que ele conseguia dizer nessa dor extrema e fiquei ali, num abraço apertado, num tudo o que podia ou sei fazer. A dor dele era pungente e me remetia a dores mal suportáveis, como tantas vividas em experiências pessoais, que, por certo, passaram longe da realidade daquele momento, mas tão intensas quanto à que eu percebia ali.Lembrei que, em determinados momentos da minha vida, dei razão a Vinícius quando disse "filhos, melhor não tê-los", contrariando o instinto natural e não questionado da manutenção da espécie. Da manutenção do conjunto genético. Da fantasia de viver depois da morte.
Dois pensamentos primitivos que acompanham o homem ao longo de sua existência desde que tomou consciência da vida e de sua finitude: o mito do Éden, com a volta a ele, e o mito da eternidade.
Engajado nestes mitos, divido-me entre o prazer e a dor.
Cada vez que tento voltar ao Éden (útero materno), contento-me com o meio do caminho que é o colo do útero e despejo meu prazer, delegando a algum espermatozóide a façanha que me é impossível. Ainda que isto me console, não nego a frustração do fracasso na tentativa instigada pelo meu ser primitivo.
Com o tempo, no entanto, a intensidade do prazer, na caminhada em busca do paraíso perdido, acaba por compensar a frustração e me faz aceitar que o retorno a ele é impossível.
Mas e a eternidade? Ah! esta é possível. Ela está ali, em cada um dos meus filhos, que a transmitirão por gerações incontáveis.
Assim é que, a par das coisas inexplicáveis dos sentimentos que a natureza houve por bem nos dotar, perder um filho é como perder um pouco da imortalidade.
E não há dor maior do que perder o que nos é mais caro.
Tanto que proliferam, de forma absurda, religiões baseadas neste mito da imortalidade.