Quando me tornei botafoguense...

Foi em 1959. Num domingo. Não me lembro o mês. Eu tinha

seis anos. E o Botafogo jogava contra o Santos. Meu pai colado no

rádio. Pontas de cigarro no chão de terra batida. E Pelé arrasando

com o Botafogo.

No rosto do meu pai a raiva de um torcedor fanático,

apaixonado e agora indignado. O Santos venceu humilhando. E

Pelé, mais uma vez, irritou o meu pai. Chateado, ele xingava,

esbravejava, até palavrão eu ouvi e então passei a ter uma baita

raiva desse tal de Pelé que causava tanto mal ao meu querido pai.

E o deixava tão nervoso. Saímos. Ou seja, ele saiu e eu atrás.

Não queria deixá-lo sozinho.

A nossa rua era uma rua comum de bairro periférico e fomos

descendo até o buteco do Beijo. Pediu uma Antártica e um

guaraná pra mim. Ele, Beijo, Vicente Cardozo, China e sô Odorico

cismaram de jogar " truco ". Ficaram se revezando, pois o Beijo

fazia o atendimento no Buteco. Meu pai pediu outra cerveja, me

liberou um pastel, doce, balas e bolinhas de gude. Ainda estava

chateado e aguentava a gozação do China. Nunca apelava.

Quando voltamos pra casa, pôs a mão no meu ombro.

Entramos. Antes de dormir, por amor a meu pai, me tornei

botafoguense.