Os chifres de Robert Pattinson (cotidiano, trágico e cômico)
Num bar, ou melhor: num boteco, em beira de praia, lá na cidade das coisas impossíveis, depois de um dia duro de trabalho, sento-me com Robert Pattinson (aquele vampiro da Saga do Crepúsculo, que levou chifre do diretor) pra tomar uma bicada.
Ele está um bagaço: branco, anêmico feito um cadáver, inimigo da vida.
O garçom chega e pergunta o que vamos querer.
- Uma cerveja gelada, uma dose de cachaça e um caldinho de peixe, digo eu.
- Um copo de sangue. Não quero comer nada, diz ele, friamente, escondendo os caninos.
O garçom sai com os pedidos.
- E então, Beto (digo eu), que bronca, hein!
- Nem fale, “man”; estou com vontade de matar aquela vampira!
- Avimaria, e vampiro morre?
- Não, “man”... É verdade... Ó céus, terei de suportar o chifre eterno...
- Danou-se...
- O pior é que eu realmente pensei ter encontrado o amor eterno! Tudo estava tão perfeito! O público aos meus pés! Aquela “girl” condenada aos meus pés! Tudo era meu...
- Sim... A eternidade... O sangue das massas, o sangue dos não-eleitos... A boniteza eterna... (falei isso meio distraído, com um cigarro aceso e os olhos pousados no mar) Que sonho!
- Como é, “man”?
- Nada... Deixa quieto... Sim, mas, e o futuro? A fila anda, hômi! Ó: tem umas meninas naquela mesa olhando pra tu...
- Não tem essa de futuro, “man”... A vida acabou.
- Veja bem, Beto: a vida tinha acabado quando você virou um vampiro, eterno na vida como na tela, e enganado nas duas (quase sorrio, mas me contive respeitosamente). Agora, a vida começa!
- Como assim?
O garçom chega. Brindamos, tomamos um trago. Eu sigo a dizer:
- Meu velho, a vida não é só sugar o sangue alheio e dar água pra elefantes! Acorde desse caixão! A vida dói, e a vida mata! Mas ela é bonita, tem uma beleza difícil de explicar, quase impossível de justificar...
- Estou entendendo...
Tomo outro copo, viro a dose de cachaça. Encorajado, continuo:
- Aquele diretor que atacou o pescoço da sua mulher, ele não dirige só filmes, como você agora pode entender. Ele dirige tudo que está abaixo dele (gente inclusive), como se fossem suas coisas, como seus brinquedos, e ele também é dirigido por outros motoristas, digo: diretores. Vocês jovens apenas pensam que comandam a vida de vocês, e que são eternos, e que podem enfiar os dentes na jugular de quem quiser, indistintamente...
- “Man”, você está sendo muito duro comigo...
- Desculpe, é que olho pra você e ainda vejo aquele vampiro à prova de balas e tal... Mas, já que comecei vou terminar: vocês são a janta que pensa que janta quem os janta, entendeu?
- Não. Coisa de brasileiro, esses ditados! Ninguém entende nada!
- Meu velho, deixa pra lá... Brindemos de novo...
Nesse momento o cara de voz e violão começou a tocar, e mandou, logo de cara, essa canção:
“Garçom, aqui, nessa mesa de bar...”
Eita, que o galã jogou seu copo de sangue na água, e agarrou pelo gargalo a minha garrafa de cerveja, que bebeu de uma vez só, de uma só virada, e à medida que a bebida descia as lágrimas lhe escorriam pela cara; primeiro, lágrimas de sangue; depois, lágrimas de “água e sal”, lágrimas de gente...
“...No bar todo mundo é igual/ Meu caso é mais um, é banal!...”
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