O velho Garça!
Ganhou este apelido do tempo em que jogava como centroavante enfiado na área, ficava ali com os olhos fixos na bola, como a garça na margem do lago, imóvel, de olho no lambari, basta se aproximar do seu raio de ação, que ela desfere seu golpe, não erra nunca.
Tínhamos acabado a tarefa de apanhar laranjas, o velho Garça tinha visto a nossa, ou melhor, a seleção do Mano jogar, inconformado com tantos gols feitos perdidos, dizia:
- Seu moço a coisa não é tão difícil assim, vou te mostrar - derrubou um jacá esvaziando seu conteúdo e me disse: - Role umas laranjas para cá, rasteiras e com força. Fiz isto, e ele rebateu direto para o jacá caido, de cada 4, 3 entravam, mudei de lado, com a outra perna a estatística não mudou. Pediu para eu pingar a bola, joguei para o alto e ele de primeira emendou, direto para o jacá, eu disse:
-Deu sorte!
- Sorte nada, esta, só eu e o Rei, o segredo está em esticar o pé, como se fosse extensão da canela...- Gabou-se.- E não tirar os olhos da bola, aqui da laranja que quica diferente da bola, qualquer desvio a gente muda a posição do pé.
Olhei para o meu jacá e vi uma laranja enorme com sinal de apodrecimento, resolvi pregar uma peça nele, falei:
- Agora quero ver a cabeçada! - Joguei a laranja para o alto, ele se postou para cabecear, mas na hora refugou, e deu uma boa gargalhada.
- Como você desconfiou, Garça?
- Se é besta que vou colocar a minha cabeça em fruta podre! Eu vi seu sorriso maroto e desconfiei que vinha sacanagem.
Contou também que era bom goleiro, um dia num campeonato de várzea, com transmissão da radio local e tudo, o goleiro se machucou e não tinha reserva para ele, então voluntariou-se para defender o gol, estavam ganhando de 1 x 0, no finalzinho do jogo, pênalti contra o seu time. O batedor já era seu conhecido, correu para a bola e fez a cavadinha tipo Louco Abreu, ele nem se mexeu, pegou a bola com facilidade. Explicou para o locutor na beira de campo:
- Já conhecia o batedor, ele tinha feito isto há tempos atrás, no que correu para a bola, eu vi o sorriso maroto no canto da boca. - Depois, concluiu para mim:
- É isto seu moço a rapaziada de hoje enxerga, mas não vê nada.