As soluções simples para todos os nossos problemas
O doutor Lemos, meu vizinho, tem a solução simples para todos os nossos problemas. É um saudosista que usa terno com colete ainda hoje, até para ir comprar o pão, leite e jornal na esquina.
Escandalizado com a violência crescente no nosso mundo, ele vive repetindo que em seu tempo a moral e os bons costumes imperavam, que havia respeito pelos mais velhos, e que cada um conhecia o seu lugar e não ousava sair dele para apoquentar os outros.
- Tem que botar para ajoelhar no milho e encher a mão com palmatória – dizia – ai quero ver se esses garotos não aprendem a ser gente!
É, botar as crianças de castigo, na escola já é uma preliminar de um sistema de correção que não existe, poderia diminuir a população carcerária do país. A própria escola poderia rastrear os casos limite de garotinhos perversos com futuro promissor no mundo do crime e passar a informação para a polícia para que ficassem de olho neles. Sabe como é, uma espécie de liberdade vigiada. O problema é que não se pode mais bater nas crianças, não fica bem, em pleno século 21, aplicar castigos corporais aos alunos. O que diriam as professoras? E a sociedade?
O doutor Lemos esboçou um sorriso:
- Meu caro, já tem gente pedindo linchamento e pena de morte... Uma boa palmatória pode fazer milagres... Temos que mostrar para esses garotos valentões com quantos paus se faz uma canoa!
Dá para entender os seus argumentos. Não sei se resolveria, mas seria uma tentativa. Outro dia quando soube das brigas de torcidas organizadas num jogo de futebol, o doutor Lemos veio com a solução:
- No meu tempo, para entrar num estádio de futebol o indivíduo tinha que estar com traje a passeio, paletó, gravata e chapéu Ramenzoni. Assisti a derrota do Brasil, em 1950, e aquele maldito gol de Ghiggia, de paletó e gravata. Fiquei com muita raiva, mas não bati em ninguém.
A sua solução: exigir paletó e gravata nos estádios. Ele acha que ninguém seria capaz de brigar com tal indumentária. Só se for para não estragar a roupa, penso eu.
O país está muito complicado e não sei se as propostas do doutor Lemos são exeqüíveis. A sua última aventura foi, exatamente, quando foi comprar leite. Um moleque exigiu a sua carteira:
- Passa a grana, vovô, senão te dou um tiro de robocop na cara!
O garoto segurava a camisa como se tivesse uma arma escondida.
- Você está armado? - perguntou o intrépido velhinho, sem desconfiar do risco que corria.
- Estou, passa a grana, já disse.
- Então é melhor você mostrar a arma, porque senão você vai é levar porrada...
Bem, reação impensada. Podia ter levado um tiro. Mas o moleque, de uns oito anos, estava blefando, não tinha arma alguma. Virou-se e correu, rua abaixo.
O doutor Lemos não correu atrás. Imagina se um senhor com um elegante terno daqueles iria correr atrás de um garoto, em plena Copacabana.
Mas a emoção foi suficiente para abalá-lo. Tivemos que levá-lo para o pronto-socorro, com o coração completamente fora do ritmo, o rosto pálido e suado. E ali entramos numa fila quilométrica.