Mandragoras por uma noite de amor.
Ela vê ao longe o filho catando algo entre os arbustos espinhosos. Naquele vale, rodeado de terras desérticas, aonde o vento assobia levantando nuvens de areia, pouca coisa resiste.
Viscejam tamareiras imponentes e uma ou outra romanzeira no oásis procurado pelos caminhantes que atravessam o grande deserto.
São seis grupos de tendas de onde se ouve o barulho das crianças em meio ao ruído constante do grande rebanho de ovelhas que teimosamente ali pastam.
Sob sua tenda, o calor arrefece e ela fica à porta esperando o filho chegar.
O menino chega e ela antecipa o gosto das mandrágoras. Tem pouco consolo, embora seja considerada uma mulher abençoada.
Da tenda mais afastada, surge a irmã envolta em um manto púrpura, com os cabelos soltos caindo em cascatas até abaixo da cintura. A outra tem os olhos frios e embora viva em desespero, seus lábios expressam um laivo onde se mescla uma pitada de vitoria misturada à amargura.
Ela sente o estômago contrair-se de dor, pois embora seu ventre seja fértil e tenha a consideração daquele marido, o amor é cativo daquele ventre seco amortalhado em púrpura que só princesas usam.
A irmã aproxima-se lânguida, disfarçando a cobiça que sente ao ver aquelas bagas sumarentas tão apreciada por todas elas. Ali reside o misterio do coração preso de um marido, elas o crêem.
Lia segura fortemente as vagens, mantendo-as apertadas contra o peito, como um tesouro.
Raquel estica as mãos e ela sente a mágoa subir em ondas amargas de raiva.
Roubaste meu marido e ainda queres as mandrágoras de meu filho?!
Tens ele esta noite, se me deres essas mandrágoras – retruca Raquel.
Lia pesa, sopesa e sente-se humilhada, afinal o marido só a procura porque o ventre de Raquel se nega a dar-lhe o desejado filho. Ela pensa, olha a figura esguia, sofrida mas bela, seca mas amada e resigna-se, afinal terá mais uma noite com aquele marido que ambas amam e anima-se com a possibilidade de dar-lhe mais um filho.
Quem sabe dessa vez ele não a amará?
Dá as mandrágoras, não sem antes olhar a irmã com amargura e encaminha-se para a tenda do marido afastada de todos no topo da colina. Entra resoluta.
Serás meu esta noite, te aluguei pelas mandrágoras de meu filho.