Remédios Irremediáveis

          Do lado de fora do balcão da farmácia, estavam um senhor e uma senhora ao fazerem o mesmo pedido: - “Selozok, por favor!” Ele já se dizia cansado por ter percorrido, em vão, oito farmácias, restava-lhe apenas ficar desapontado... Então lhe apareceu a pergunta de rotina: “- De quantos miligramas?” E o atendente, mesmo já de costas para o cliente, deu-lhe a resposta: - “Se de 25, não tem nem pra remédio...” Irritados, os interessados protestaram que, há mais de dois meses, falta esse remédio por causa das farmácias só o oferecerem com 50 miligramas, e os médicos continuarem a receitar esse medicamento, de nome de detetive, de 25... E então?

          Saindo detrás das prateleiras, surgiu uma senhorita, de túnica branca, tentando remediar a situação: - “A senhora pega uma faca e reparte o comprimido de 50 em dois pedaços de 25.” Foi quando interveio o senhor: ” - Mas quem garante que não serão pedaços de 37 e de 13 miligramas? Não é meu trabalho, senhorita, mas já fiz isso; o pequeno e mole comprimido se esfacela em pedacinhos de 5, 3 e 2 miligramas...” Com ares de “doutora”, retirou-se a senhorita, falando alto: “– Bem, senhor, compre genérico de “succinato de metoprolol”, para logo corrigir, balbuciando: “É, dele não há genérico”. Findando a conversa, a senhora, preocupada, explicou: “- É pra minha mãe, que só acredita no remédio escrito pelo médico, também não dá fé a esse tal de genérico. E remédio desacreditado não cura”.
         
          Esse tipo de desrespeito ao povo parece acontecer como tudo se fosse normal e coisa de “país sério”. Tudo ficou como antes: as reclamações sem ouvido, diante do poderio dos capitalizados laboratórios; e, de saúde e paciência usurpadas, o povo sofrendo a doença, a carestia e esse desassossego. Fiquei a raciocinar que o excedente sem procura dos tabletes de 50 e de 100 motivasse o laboratório a condicionar o consumo desses tabletes de 50 miligramas e, sem dar satisfação, a não vender os de 25. Os médicos continuam a prescrever comprimidos de 25 e, os clientes, resignados, a partirem os comprimidos com a faca, submissos a essa “droga” de imposição insolvente. Quanto a esse estresse, há muito, os clássicos também tinham se pronunciado, como Molière: “Quase todos os homens morrem de seus remédios, e não de suas doenças”, ou como Virgílio: “(...) pioram com o remédio
.”