As Aparências Enganam
Fim de tarde. Hora do “rush”.
A fila interminável aguarda impaciente. De todos os lados surgem lamentações do tipo calor, cansaço, descaso dos governantes, chegar atrasado, isso é um abuso ... O ônibus chega ao ponto com um pouco de atraso. Faz circular com início na praia, seguindo a perimetral até voltar ao terminal de partida. Além da superlotação, as ferramentas de trabalho variam dos livros e cadernos de professores e alunos, aos balaios de peixes, redes de pescar, cestos de frutas, pás e enxadas de pessoas que voltam de seus empregos. Comprimidas e sem conforto, mais parecem sardinhas enlatadas, principalmente com o forte aroma de peixe que exala dos balaios. Isso provoca náuseas. Uma hora difícil para quem não dispõe de um transporte particular e tudo o que pode acontecer, é contrair uma dose de estresse, após um dia de trabalho.
Sem conseguir atravessar e ir para os bancos da frente, sento-me em um banco perto da porta traseira, antes de passar na borboleta. Moro longe e é melhor esperar que vague um pouco. Em outras vezes que fiquei na parte da frente, quase morri asfixiada e não consegui sair ao chegar ao meu ponto, indo descer muitas paradas depois. Pior ainda, ter que andar muito mais a pé para chegar a casa.
Para minha surpresa, o trocador é novato. É um homem jovem, estatura mediana, magro, cabelos louros. A cada passageiro que pára na borboleta, após fazer o pagamento, diz solenemente:_”Passez, sil vous plaît”! As pessoas olham-no sem entender, mas obedecem pelo gesto cortês que faz, apontando-lhes o caminho da saída.
Pergunto a mim mesma a razão de colocarem um estrangeiro em um emprego assim, onde as pessoas não têm o mesmo nível de cultura para entender sua língua, tornando-se difícil a comunicação num lugar em que tudo concorre para um comportamento diferente, geralmente sujeito a agressividades. Isso é uma constante nos ônibus superlotados, principalmente nos transportes da periferia. Ele, porém, trata a todos igualmente sem mudar a postura de europeu elegante.
Está próxima a parada em que vou descer e apresso-me. Ao pagar minha passagem, ele diz:
_ Passez, sil vous plaît!... (Passe, por favor!)...
_ Non. Vous n’avez pas me donnez mon argent. _ Respondo. (Não. Você não me deu meu dinheiro).
_ Passez, sil vous plait!
_ Non. Je veux que mon changement!… (Não. Eu quero meu troco)
_ Passez! Passez!.... _ Diz, impaciente.
_ Mon changement, monsieur... (Meu troco, senhor...)
_ A Senhora não é brasileira? _ Pergunta em português bem tupi-guarani.
_ E o Senhor, não é francês, suíço, canadense?...
Em meio à situação constrangedora, recebo o troco da passagem e automaticamente, agradeço:
_ OK!
Ao que responde:
_ Bye!...
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Maria de Jesus Fortaleza, 14/08/2012