Voltas que a vida dá...
Ela andava bastante irritada, irritada por nada e irritada por tudo. Irritada pelo tempo que perdeu, pelas escolhas erradas, por se enganar tanto com as pessoas... Irritada por ainda acreditar no lado bom de tudo e de todos.
Vontade de mudar tudo. Radicalmente. Mudar de casa, de móveis, de bairro e até de cidade, porque não? Se lembrou que não tinha filhos, não era casada, nada a prendia a lugar algum. Só tinha que voltar para sua casa, não para ninguém. E esta sua casa podia ser em qualquer lugar. Podia arriscar muito mais que muita gente. Podia conseguir um emprego em Pernambuco, em Porto Alegre, na Bahia ou até no Rio de Janeiro. Podia se mudar para o Egito, servir café em Nova York, nada a prendia em lugar algum. Podia começar do zero, quantos zeros ela quisesse. Conhecer povos novos, gente nova, cultura diferente, podia pintar seu cabelo, virar morena, colocar lente azul, ficar um pouco mais gorda, subir no salto e ficar mais alta. Podia mudar seu estilo de vida, estilo de roupa, estilo de lugar. Era dona do seu próprio nariz e nem gato tinha para cuidar. Não devia cuidados a ninguém. Podia ser ela mesma. Enfim. Podia se auto-suportar como bem entendesse e até quando não se entendesse. Ela estava completamente perdida, sozinha, vazia, quieta, insuportavelmente linda, maravilhosamente interessante como sempre. Evitando os olhares maliciosos de tantos, evitando enxergar interesse de muitos, optando por andar a sós consigo mesma. Em meio a grande tempestade, vira-se com toda sua clareza, com toda sua certeza, misturada com sua inevitável dose de bom humor e simpatia e proclama aos olhos de quem não consegue dela desviar e diz:
..."Posso ser e fazer o que eu bem entender, porque a vida é uma só e enquanto eu viver, posso mudar tudo quantas vezes eu quiser!..."