MEU PAI
Meu pai era muito bonito e bom. Ocacir de Oliveira Martins.
Ele amou sua mulher Zezé durante a vida toda. Estudava Farmácia no Rio de Janeiro e estava no terceiro ano. Tinha vinte e quatro anos. Era o ano de 1924 e o Rio Antigo devia ser muito bonito.
Zezé, minha mãe, morava em São João Nepomuceno, em Minas. Tinha dezessete anos e era namorada dele. Nas férias se encontravam. Mas o amor foi mais forte que os estudos. Um dia, ele não aguentou de saudade, largou os estudos e voltou para São João. E casaram. Seu pai, o Vovô Ricardo, era um homem importante em são João e tinha muita influência na cidade. Vendo seu filho Ocacir, o mais velho dos catorze filhos, de volta e querendo casar, arranjou-lhe uma nomeação de Diretor do Grupo Escolar local. E meu pai a partir dali, virou Diretor de Grupo Escolar, orador e intelectual, muito querido pelas professoras.

Casaram e tiveram cinco filhos. Os três primeiros receberam uma educação muito rígida. Houve um intervalo grande até o meu nascimento. Com seis meses em São João, partiram para uma vida melhor em Visconde do Rio Branco, onde também foi Diretor do Grupo Escolar Carlos Soares.  Nesta cidade eu fui uma criança mais feliz do mundo. Por isso tenho imenso carinho com esta cidade e a considero mais de nascimento. Ali nasceu também o meu irmão mais novo.
Anos depois, já Inspetor Técnico de Ensino, fomos para Leopoldina onde ficamos até ele se aposentar. Éramos uma família tradicional mineira e vivíamos muito bem. Minha mãe já foi mais branda na educação dos dois filhos mais novos.
Era rigorosa e receava a traição do marido. Não falava nisso, mas nós filhos percebíamos. E uma vez ela suspeitou que ele agisse errado com a empregada. Mas não era verdade. Só percebi que ele estava triste e fora se refugiar num pequeno quarto meio esquecido da casa. Preocupada ou alarmada por suas feições, fui atrás sem que ele notasse. No refúgio, achando-se só, ele chorou. É muito triste ver um homem chorar. Retrocedi sem que ele notasse e fui para o quintal com meu coração machucado por vê-lo injustiçado e triste. Só.
Nesta narrativa percebo a formação do meu caráter.

Os anos se passaram e viemos para Petrópolis, RJ.
Quando ele morreu,  a minha mãe sentiu-se temerosa que os filhos a julgassem de alguma coisa. Chamou-me para sair com ela, quase obrigou e foi comigo numa loja da Avenida comprar materiais de revestimento de piso e paredes do banheiro do sítio que ela me dera. Horrível, eu não tinha o menor interesse naquilo, pois parecia que o mundo tinha que acabar no dia seguinte da sua morte.

Ela o amava também como ele a ela, ele era o seu esteio.

Esta é uma história triste de contar.