Absolvição

Absolvição

De tanto ouvir os defensores dos denunciados no esquema do “mensalão” pedirem a absolvição dos seus clientes, por não terem eles, nas suas versões, cometido nenhum delito, entendi que poderia eu também pedir a absolvição de alguns outros “delinquentes”. Não que seja eu adepto da impunidade, mas tenho os meus próprios conceitos de justiça. Assim, peço a absolvição do pobre sertanejo que matou um nambu, ou caçou um tatu, para saciar a sua fome, mesmo sendo crime inafiançável. Pediria a absolvição para aquela dona de casa, flagrada subtraindo de um supermercado um pote de margarina, quem sabe para ser usada em alguma fritura, ou para dar um gosto adicional a um pedaço de pão ou bolacha, que alguém lhe teria dado. Foi presa e ficou assim por muito tempo, por falta de quem a defendesse. Pediria absolvição para o ladrão de galinha, que flagrado com a “penosa” nos braços, defendeu-se dizendo que não sabia como a ave teria voado até ele. E vejam que galinha não voa. É cômico se não fosse trágico. Foi preso. Pediria a absolvição dos beneficiários dos “bolsas de tudo”, que não aspiram abrir mão delas, porque o governo assim as viciou. Talvez pedisse a absolvição até para as mulheres que vendem os seus corpos, por absoluta falta de opção para sobreviverem. Como somos hipócritas muitas vezes e omissos outras tantas. Pessoalmente, só consigo absolver-me quando arrependo-me e tento reparar o mau cometido, tarefa nem sempre possível.

Como a nossa legislação é injusta e casuísta. Como os caminhos, ou descaminhos, da justiça em seus meandros ignoram os pequenos e protege os poderosos. O “todos são iguais perante a lei”, não passa de linguagem de retórica. O grito dos pequenos é silenciado pela a ação dos poderosos, sob o olhar complacente de uma justiça inepta que nós mesmos construímos. Mas continuo pedindo a absolvição, e desta vez para o eleitor incauto, ignorante, omisso e descomprometido, e aí incluo os falaciosos propagandistas do voto nulo, que não sabendo o que fizeram, elegeram a classe política que aí está nos representando. Esquecemo-nos em quem votamos e quem elegemos. As bienais oportunidades de votar que nos são oferecidas, resultam em novas frustrações.

Quando lembro-me do famigerado “mensalão”, cuja existência está sendo questionada, fico a pensar na possibilidade da absolvição dos denunciados pela Procuradoria Geral da República. Como seria possível que na movimentação de recursos, das mais diferentes origens, envolvendo um tão grande emaranhados de ações e pessoas, não se tenha cogitado da existência de nenhum crime? Como admitir que a nossa autoridade maior não tivesse nenhum conhecimento? Fico com a sensação de que querem me fazer de idiota.

E assim vamos levando a nossa existência, enfrentando todo o tipo de opressão. Entendo que, caso os “mensaleiros” sejam absolvidos, caberia então a condenação do ilustríssimo Procurador Geral da República, por calúnia e difamação a esses dignos, íntegros e honestos brasileiros que tanto fizeram e continuam fazendo pela nossa pátria, mãe gentil. E haja paciência.