ELIMINANDO RAÍZES
ELIMINANDO RAÍZES
(Crônica de Carlos Freitas)
Dias atrás, num trabalho de renovação de terra e poda em algumas flores, uma em especial me chamou a atenção: Um Antúrio (Anthurium Andreanum), planta ornamental, tropical, herbácea, com mais de 600 espécimes. Há muito, suas raízes havia avançado além-vaso, fazendo-a soçobrar ao peso, escondendo assim sua beleza. Decidi então, devolver-lhe seu encanto natural, podando-a e eliminando o excesso de raiz. Todavia, restou-me a dúvida quanto à eficácia dessa ação. Talvez, na ânsia de querer dar-lhe nova vida, eu poderia estar decretando sua morte.
Fiquei sabendo depois, que aquelas raízes, era resultado de quase 50 anos de existência. Fiquei surpreso com sua capacidade de, em condições adversas, resistir a tanto peso por tanto tempo! Percebi porem, que a natureza mesmo que de forma torta, pode manter a vida. Aquela enorme raiz era o cordão umbilical, que a ligava à terra do vaso.
Como se fosse um parto - cortei esse cordão deixando-a novamente ereta, livre e vistosa. Livrei-a das folhas mortas e a devolvi ao vaso, agora podada e energizada por uma terra renovada. Tudo que almejava, é que recomeçasse uma nova existência, e voltasse a exibir sua exuberância natural de antes.
Passados alguns dias, notei que o Antúrio assimilara positivamente à drástica “cirurgia” que lhe impusera. Via-se o broto de uma nova flor! Suas folhas, na plenitude de uma homogênea vivacidade até então esquecida.
A singularidade e, intensidade dessa situação transportou-me para o nosso mundo, onde deparamos com pessoas sem a capacidade de percepção daquilo que lhe é maléfico e danoso. Muitas vezes e inconscientemente, deixam-se envolver pelas raízes de sentimentos funestos. Sem força de reação, entregam-se aos percalços, desilusões e neuroses os quais, comparo ao Antúrio e seu excesso de raízes. Ao mesmo tempo, que lhe davam vida, também mutilavam sua beleza.
Lenta e silenciosamente, sem que percebam, esses indivíduos prostram-se. Frustrados, vão se alijando do convívio social saudável. De forma avassaladora, sentir-se-ão envolvidos num complexo emaranhado, e tardiamente perceberão sua desventura.
Com a ausência da autoestima, uma positiva postura pessoal, sem defesas psicológicas sólidas, e, sem sustentáculos fundamentados no bom senso e na capacidade de superação, serão mais uma presa do malévolo e perverso sentimento de derrota, do menosprezo e da depressão. Se não despertarem a tempo, e, com ajuda ou não, não se proporem a eliminar todas as raízes atrofiantes que envolvem e bloqueiam suas vidas, certamente sucumbirão na escuridão.