Um Padre de Coragem
Maria José Marculino Vieira ( vó Maria) era devota do Senhor Bom Jesus desde a época em que morava em Seabra. Quando chegou em Aguada Nova, em 1946, continuou a devoção no seio de sua família. A festa religiosa era, essencialmente familiar, mesmo com a igrejinha construída pelo senhor José Maria, dona Maria Marculino Vieira celebrava o dia seis de agosto em sua singela casa com a participação dos vizinhos e familiares, estes, residentes no povoado de Lajeado.
A festa foi crescendo e tomou a proporção que é hoje. Com o passar dos anos, O Bom Jesus, o Dono da Festa, foi perdendo seu espaço paulatinamente, mas de forma continua. O palco da festa mundana foi, a cada ano, empurrado para mais perto da Igreja. Os bares já não fechavam as portas na passagem da procissão, as barracas tomaram conta das ruas por onde passava a caminhada cristã. Os parques de diversão invadiram uma rua inteira. Os padres anteriores reclamavam, mas no ano seguinte nada mudava. O Dono Festa, O Homenageado, ficava a cada ano, em segundo plano.
Mas, eis que chega à comunidade, o padre Carlos Alberto. Com segurança, anuncia para a comunidade católica que o dia seis de agosto é do Bom Jesus, e por isso este dia inteiro era para O Padroeiro. Esta declaração gerou polêmica. Pessoas mal intencionadas anunciaram, aos “quatro ventos”, que o padre queria acabar com a festa. Minha decepção foi grande. Fiéis que eu considerava cheios do Espírito Santo traem O Bom Jesus. Impossível não me lembrar de Judas. Impossível não me lembrar de passagens bíblicas, “nem todo aquele que diz senhor, senhor, entrará no reino dos céus”.
Naquele ano, após as missas novenárias, muitos componentes dos grupos demonstraram o descontentamento com a imposição do padre. Nas ruas, nos bares, nas esquinas os ataques continuam, mas eram de pessoas que não eram igreja, portanto, para mim, naturalmente compreensível. Numa dessas noites das novenas de 2011 expus minha opinião de educadora, apoiei o pároco. De cima do altar eu vi o desdém de muitos, ignorei e continuei. No entanto, em meu coração havia uma tristeza, tinha quase certeza que o padre não conseguiria. A elite de Aguada Nova se manifestaram contra o que eles chamam de “quebra de tradição.” Mas a festa do Bom Jesus não é propriedade da elite, do prefeito ou dos católicos de mentirinha. A festa é do Bom Jesus, e era chegada a hora Dele tomar o seu lugar de direto.
Relembro os dias nublados do ano passado em que se ouvia “a boca miúda” que o padre iria ser transferido. Meu coração pesou. Cogitava-se que na procissão não teria público, que o show católico também não teria público. A elite de Aguada Nova estava preocupada com um público em quantidade. Mas o publico do Messias é em qualidade. O padre foi firme e não cedeu um milímetro.
O padre conseguiu. Em 2012, o seis de agosto foi dedicado ao Bom Jesus.
Na hora da procissão eu estava exausta. Pensei em não ir, mas mudei de ideia. Eu defendi a decisão do padre e não poderia deixá-lo. Fui à procissão. Quando virei o rosto me surpreendi com a quantidade de pessoas. A felicidade em meu coração não dá para descrever nesta crônica. À noite, o show. Fui com meu esposo e minha filha. Fiquei emocionada quando vi os jovens e adultos de minha família se divertindo, louvando, cantando, orando ou simplesmente apreciando. Meu coração ficou calmo, e agradeci muito a Deus. O Dono da Festa foi lembrado, homenageado durante todo o dia seis: alvorada, três missas, uma procissão, a bênção do Santíssimo e o show católico. A festa do Bom Jesus, este ano, foi uma festa de família, a Família Católica como vó Maria começou naquele primeiro seis de agosto de 1946. O Bom Jesus mandou um padre de personalidade forte, de coragem, sobretudo de fé, para romper com a “tradição mundana” e fortalecer a tradição cristã.
Viva O Bom Jesus! Viva o Padre Carlos Alberto! Viva a família, verdadeiramente, católica de Aguada Nova.
Luz Ribeiro, 07 de agosto de 2012