Olho clínico

Velhos clichês precisam ser mudados, afinal muda-se até de time, mas a genética não se altera, a cor dos olhos, os trejeitos de cada um e toda uma gama de características vem num velho bornal, que carregamos de pai para filho, literalmente.

Ele trazia no sangue um olho clínico para detectar talentos no esporte; chegou a ver um grilo com um salto diferenciado, mas deixa isso para lá, afinal grilo não participa de grandes eventos esportivos.

Estava no início de um ciclo olímpico e ele sem um atleta para treinar, não conseguiu destacar um ginasta que pudesse elevar seu nome numa olimpíada, nenhum atleta que tivesse condições de subir ao pódio.

Descansando numa fazenda de um velho amigo, observou um garoto furtivamente atravessando o pasto, para alcançar um pé de jabuticaba que dava frutos maravilhosos

Nenhum cachorro denunciou a presença do pequeno e clandestino apreciador de jabuticaba, ou apreciadores, pois logo em seguida uma menina o seguiu, de forma não menos furtiva. Para cada cachorro preguiçoso, uma vaca ativa, e cumprindo este princípio lá vem a “mimosa” enfurecida, querendo fisgar os pequenos transgressores.

O menino rapidamente se jogou ao solo e rolou para baixo da cerca, saindo incólume da investida; a menina, com graça, leveza e feminilidade, saltou a cerca de arame farpada, como se aquele gesto fosse seu esporte diário e preferido.

O salto encantou o técnico que a tudo assistia, já não mais temeroso de ver uma criança sendo ferida por uma vaca desenfreada.

Falou com a criança, procurou a família da menor e expôs seu plano de fazer dela uma atleta de ponta; e os treinamentos se iniciaram.

Longos quatro anos de treinos, de regime, de exigência deram à garota a aparência de uma atleta olímpica; infelizmente somente aparência, pois na área de execução do salto e dos meneios acrobáticos ela não correspondeu, além de afastar-se demasiadamente dos limites permitidos, ela temia pisar fora do espaço delimitado, enfim, ela não mostrou seus encantos pelos quatro cantos daquela arena.

E o que faltou para melhores saltos, que ela tão bem executava nos pastos?

A vaca...sim, faltou a vaca que a impulsionava, que a motivava e lhe dava charme. O técnico sabia, de sobejo, que nunca o Comitê Organizador das Olimpíadas nunca iria permitir que ele ficasse à beira da arena segurando um agente motivador.... uma vaca. E um chip implantado na memória da atleta traria a ela, de volta, a leveza, a graça e altura que seus saltos deveriam atingir?

A verdade é que a carreira promissora de uma saltitante “cabrita” se viu cerceada pela falta de uma vaca trampolim.

Roberto Chaim
Enviado por Roberto Chaim em 07/08/2012
Reeditado em 07/08/2012
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