Uma coruja mais
Ouço quando sobrevoa a casa uma coruja. Não gosto dela. Nunca gostei. Aliás, devo ter algum problema, pois não gosto muito de animais, principalmente se estiverem por perto. Todas as noites adormeço com ela vocalizando alguma coisa perturbadora, que não sei descrever. É um barulho indefinido, que chega a me confundir. Nos primeiros dias tive medo, achei que era uma cobra que havia por ali. O som mais parecia com o sibilar de uma serpente do que com o piar de uma ave.
Comentei com uma pessoa esse fato e ela me fez perguntas que, de imediato, me fizeram recordar falas da minha mãe. Muitas crendices que eu poderia ter herdado da minha genitora, ficaram no esquecimento. Pouco passei às minhas filhas dos cuidados exagerados e sem cabimento que ela preservava, devido a certas histórias que sobreviviam às gerações.
Dei risadas lembrando do que ouvi na infância. Quando eu era menina a coruja tinha o nome de “rasga-mortalha”. E a história que minha mãe contava é que ela era um animal agourento. E que, se passasse por sobre uma casa, “cortando e rasgando a mortalha”, era sinal de mal presságio: alguém da casa morreria em pouco tempo.
Superstições à parte, eu bem queria me livrar disso, mas suponho que esse ser assustador esteja morando numa das árvores do quintal vizinho. E nem sei se está só. E essa ideia me deixa, de certa forma, encucada: nem na minha cama eu tenho sossego? Que lástima! Será que vou ter que me acostumar a dormir embalada pelo som dessa criatura? Era só o que me faltava! Primeiro, eram os cães da vizinha do lado. Três. Latiam a noite toda, e parecia ser no meu ouvido. Depois, os gatos namorando no meu muro. Deus me livre! Eles são terríveis. Eu acordava de um susto, com aqueles gritos. Sim, eram gritos! Outras vezes, as brigas na rua, vizinhos “discutindo” a relação, no meio da madrugada: “seu 'num sei o quê', vou chamar o Ronda!”... agora, coruja, e ainda por cima me agourando?
Ah, já não me bastavam as “corujas” diurnas? Eu mereço!