No vagão do tempo

No interior daquela imensa estação ferroviária me deparei com uma maria-fumaça exalando muita mas muita fumaça e já divulgando seu primeiro apito, sua imediata partida. O vagão restaurante estava aberto e não pude me conter, entrei e me deparei com aquelas belas e graciosas donzelas, todas bem vestidas com seus chapéus, cada uma com um modelo diferente e irreverente, na cor rosa, azul, todas na cor da beleza.

Tudo parecia diferente, as moças eram mais femininas, as senhoras eram donas da verdade, precisas em seus conselhos e absolutamente madames. Já os senhores, estavam vestidos com seus fraques, debaixo de suas cartolas, camisa “engomada”, branquíssima, sapatos polidos que seu brilho reluzia a luz dos postes da estação, seguiam segurando suas bengalas, cada um a seu estilo e as correntes penduradas segurando seus relógios de bolso, num ouro de outro mundo.

uuuUUUUuuuuuu, apitou pela segunda vez a tão enorme e brilhante maquina que levaria aquele tempo adiante pelos trilhos do destino.

As bagagens coloridas, redondas, quadradas, umas com listas outras em xadrez, que mais pareciam enfeites nas mãos das damas iam se acomodando na parte superior das cabines, sempre acompanhadas de risadas descontraídas e com a calma que só naquele tempo é capaz.

Um senhor com um chapeuzinho meio que redondo e azul com seu uniforme, também todo azul e um apito no pescoço, passa pelo lado de fora, a ser visto por todos se deslocando de um lado ao outro da janela e não demora muito, vvvvvvrrrrrriiiiiiiiiii, o apito soou, faltavam agora apenas um minuto para a partida, a viagem estava prestes a iniciar e as crianças corriam de um lado para o outro em meio a risadas e as ordens a severas de seus pais para se colocarem em seus lugares e permanecerem sentadas.

Novamente uuuUUUUuuuuuu acompanhado da voz austera e firme do auxiliar de maquinista: “Todos a bordo”, e alguns segundos schuff, schuff, schuff e o movimento lento começa a impulsionar o imenso trem com suas poltronas confortáveis e suas mesas tranqüilas suportando o calendário marcando 30 de novembro de 1922.

Crônica selecionada para o livro do VII Prêmio literário Valdeck Almeida de Jesus de 2012

Domingos Richieri
Enviado por Domingos Richieri em 02/08/2012
Reeditado em 11/08/2012
Código do texto: T3810729
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