AMIGO DE TODOS

Na medida dos amigos considera-se a quantidade ou afere-se a qualidade. Entre os amigos que tenho e as pessoas com quem me dou, são menos os que conto na mão direita, são mais os que a esquerda multiplica. Ao contrário do que se diz por aí, amizade – assim como o amor - não se escolhe; acontece naturalmente por afinidade de que decorrem justificadas razões afetivas.

Ter um milhão de amigos seria bom. Ser amigo de toda a humanidade, tanto melhor. Para isso, em ambas as hipóteses, há que se ver qual medida se levaria em conta. A minoria aperfeiçoa qualidades que a quantidade, em maioria, degenera. Mas, sabe-se também que a perfeição não é privilégio de um só; ninguém a consegue sozinho. Limitado e incompleto, cada qual há de com outro completar-se. Quem se basta em si mesmo é um erro da própria medida.

Por escolha, eventualidade, conveniência ou afinidade as relações acontecem, estabilizam-se ou se findam conforme condições ou circunstâncias. A vida promove amizades que o tempo as comprova ou não. A morte cultiva saudades ou sepulta lembranças. Quem amizades vive ou viveu, verá.

Houve quem viveu cercado de muitos toda vida e só contou com o mínimo no último instante; o da morte.

Fui acompanhado ao cemitério por onze amigos. Onze amigos!” * E entre aqueles “fieis de última hora” *, ponderou àquele que lhe fizera a homenagem póstuma: “Bom e fiel amigo! Não me arrependo das vinte apólices que lhe deixei.” *

Houve também quem reuniu doze amigos, dentre os quais um negou-lhe três vezes, (Pedro); outro dele duvidou, (Tomé); outro que o traiu, (Judas Iscariotes). Ao primeiro um olhar de complacência; ao segundo estendeu-lhe a mão ferida para que a tocasse; ao terceiro surpreendeu assim saudando o traidor: “Amigo, a que vieste?” Seguramente este foi o gesto de quem, indistintamente, tendo sido amigo dos doze, ama toda a humanidade.

____________________________

Machado de Assis in Memórias Póstumas de Brás Cubas.

  Amigos, em meio à silenciosa distância, uma alusão à data de hoje. 
  Até quando for possível o meu retorno.

 
 Aqui está A HORA ÍNTIMA, na interpretação do autor,
 Vinícius de Moraes.
 

http://www.youtube.com/watch?v=_mEmrSCz6_Y
LordHermilioWerther
Enviado por LordHermilioWerther em 20/07/2012
Reeditado em 23/07/2012
Código do texto: T3788900
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2012. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.