O Chafariz do Bananal

O Chafariz do Bananal
para Daniel

Na bela Serra da Bocaina em meio à casarões históricos e histórias contadas de geração para geração, encontrei aquela cidade . Era a última do meu roteiro de viagem. Com um pezinho em SAMPA outro no Rio de “Janero”, como diriam os nativos daquela parte do Brasil. Estamos falando de Bananal, uma linda cidade. Calma, bucólica, mas com uma população jovem e agitada. Ao chegar, o que mais me chamou a atenção foi o chafariz da praça matriz, inaugurado em 1880. Já vi muitos por aí nas minhas andanças, mas aquele tinha algo especial. Era todo trabalhado com um tipo de arte diferente. Tinha um design que me inspirava escrever sobre ele.
Parei e fiquei olhando, imaginando as pessoas de antigamente indo até ali colher num pote seu líquido precioso.
Imaginei as mocinhas da época inventando desculpas para buscar água e aproveitando para dar uma olhadinha nos rapazes, que talvez ficassem circulando pela praça, à procura de uma bela jovem, para casar.
Hoje não, mas antigamente era proibido, as moças se insinuarem para os rapazes, o correto era eles tomarem a iniciativa e antes de tudo, pedir permissão aos pais para namorá-las.
Resolvi dar um giro pelas ruas à procura de mais alguma coisa inusitada e encontrei a Pharmacia Popular, a mais antiga do Brasil. Construída em 1830 pelo boticário frances, Tourin Domingos Monsier e batizada como Pharmácia Imperial, mudou de nome com o fim da monarquia e passou a se chamar Pharmacia Popular. Em 1922 foi adquirida pelo Sr. Ernani Graça pai do atual proprietario, Sr. Plínio Graça que assumiu a farmacia em 1956 após a morte de seu pai. O Sr. Plínio já foi prefeito de Bananal por duas vezes e se lembra quando a estrada Rio-São Paulo passava na frente da sua farmácia. Depois construíram a Via Dutra e a cidade ficou “às moscas”, do dia para noite.
Apresentei-me como turista e tive a honra de ser recebida por ele em pessoa. De uma lucidez impressionante, ainda mantinha as vidrarias, balanças, raízes, pomadas, sais, tinturas e apetrechos para fabricação de remédios, do tempo do pai dele, ou antes até.
Livros com fórmulas antigas, contabilidade, anotações, tudo amarelado, mas impecavelmente organizado.
O laboratório, ainda com porcelanas e bancadas do tempo, em que os remédios eram manipulados, antes das indústrias produzir em larga escala e assim “aumentar a quantidade e diminuir a qualidade”, palavras dele, não só dos remédios mas de tudo que se produz em massa.
O piso revestido com ladrilhos franceses, bancos em madeira de lei e balcões em pinho, uma preciosidade.
Senti que aquele senhor de seus noventa anos, era um homem romântico e sensível, percebi que precisava dispensar uma atenção especial a ele. Mas notei que se cansava com facilidade e não seria bom incomodá-lo.
Então agradeci a atenção e resolvi continuar o meu giro com a promessa de que voltaria mais tarde.
Saí dali para visitar uma estação ferroviária antiga, construída com placas de metal importadas da Belgica, no começo do século passado. Hoje funcionando como um departamento da prefeitura, uma pena porque deveria ser mais bem aproveitada, como ponto turístico importante. Achei um desperdício, abrigar apenas servidores públicos municipais, burocratas e sem paciência para responder curiosidades de turistas.
Ainda visitei a Igreja Matriz, Senhor Bom Jesus do Livramento, construida em 1811.
Voltei para minha pousada Amiga, mas não sem antes passar pelo casarão Comendador Luciano José de Almeida, na praça matriz, de onde conseguia ver o chafariz que tanto me encantou e pela segunda vez fiquei olhando-o, extasiada. Senti vontade de saber mais sobre ele.
Encontrei dois senhores donos do casarão construído em 1847, mas desde 1922 abriga o Hotel Brasil. Tinha sido construído por seus antepassados, no estilo da “Arquitetura do café”, com sua varanda toda em ferro talhado, composto por treze janelas e nem sei quantas portas, até hoje não me lembro se os dois eram irmãos ou o que. Mas me receberam bem. Falaram horas sobre seus antepassados, mas nada sobre o chafariz. Nem se interessavam por ele.
Já era noite quando fui experimentar a gastronomia local. Encontrei um restaurante na parte superior de um sobrado. Acabei fazendo amizade com seu proprietário que me ofereceu alguns pratos para degustação e aperitivos especiais, coisa fina, produzido na terra. Convidou-me para ir até Angra dos Reis. Segundo ele era bem pertinho dali, rapidinho se chegava à Barra Mansa e de lá era só descer a serra e se encantar com a beleza das praias.
Mas meu tempo era curto.
Prometi voltar um dia com mais tempo, para saber mais, sobre tudo e principalmente sobre a Pharmacia Popular e seu simpático proprietário. Que voltasse logo então, recomendou ele, pois o Sr. Plinio das Graças já estava com mais de noventa anos e não ia durar muito tempo.
É a Lei da natureza. Existem pessoas que eu gostaria que fossem imortais, o Sr. Plínio é um deles, infelizmente não é, mas vou classificá-lo como insubstituível na minha concepção.
Infelizmente agora, o Sr. Plínio da Pharmacia Popular, já não faz mais parte do mundo dos vivos, conforme foi amplamente divulgado pela imprensa regional.
Um dia pretendo voltar ao Bananal e ver se ainda encontro o meu amigo do restaurante e alguém que possa me falar mais sobre aquele chafariz que pode ser insignificante para tantos, mas que se tornou tão importante para mim.

Joana Aranha 20/07/2012

Joana Aranha
Enviado por Joana Aranha em 20/07/2012
Reeditado em 15/09/2012
Código do texto: T3787503
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