Verdade suja
 
            Abriu o jornal com a calma dos vagabundos e preguiçosos.
            Não estava fazendo nada, era feriado comprido, daquele que o povo gosta, fica sem obrigação maior três dias.  Pro seu azar, o dia estava nebuloso e frio, mas suportável.  Queria pegar um Sol, mas nada.  Teria que esperar uns dias.
            Ajeitou-se na cadeira, havia trazido a mesinha da varanda para onde havia luz, tomou mais uma boa talagada de uísque e continuou virando displicentemente as páginas do jornal.  Levou um susto.
            - Essa não!
            - Que houve, Fagundes?
            - Olha aí.  Reconhece?
            - Mas é a Rita, homem!  Que aconteceu?  - E não esperou a resposta, apanhou o jornal das mãos do marido, que já havia retirado a camisa fina de lã e agora estava só com a de malha.  Ficar na luz, mesmo que o Sol não esteja aparecendo, sempre aquece mais do que dentro de casa.
            - Fagundes!  Você leu a notícia toda?
            - Li.  A fulana acabou mostrando quem é.  Sempre teve pinta de perigosa, mas esta foi de doer.  Uma professora, divorciada, é verdade, mas uma professora flagrada dentro do carro, rua pouco movimentada, com um guri de dezesseis anos.
            - Que vergonha para a filha!
            - Qual!  É outra putinha, anda com dois namorados, já vi os encontros, na cara de todo mundo.  São duas, Clarisse, são duas.  Mãe e filha.
            Tomou mais uma dose do scoth sem gelo.  Espanto por qual causa?  Só se a notícia suja tinha alterado um pouco o noticiário de todos os dias.  Políticos safados, empresário conhecido pagando para aparecer na mídia escrita, bundudas sempre presentes, querem parecer as maiores mulheres do mundo, maiores e melhores, quando são apenas mulheres em princípio do processo de obesidade.  Ah!  E os jogadores de futebol.  Daqui e estrangeiros.  Todos os dias nas manchetes, como as tais exibidas.
            Sabe?  A notícia da Rita com o garotão não era suja.  Eles só não estavam no lugar certo, deveria haver mais discrição.
            As notícias sujas são as outras mesmo...  
 
Jorge Cortás Sader Filho
Enviado por Jorge Cortás Sader Filho em 15/07/2012
Reeditado em 07/10/2012
Código do texto: T3779050
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