As fascinantes mulheres em Machado de Assis

Vou confessar, apesar de temeroso, sempre fui fascinado pelas personagens femininas em Machado de Assis. São mulheres inteligentes, audaciosas, elegantes e sedutoras. Suas personagens fazem parte de um quadro atualíssimo, pintado pelas mãos de um mestre das letras. Um perfeito retrato da mulher do século XXI. Suas mulheres tomam as decisões, surpreendem, intimidam os homens. Causam medo, mas também fascínio.

O leitor poderia contra argumentar-me. Mas elas não são ambiciosas, dissimuladas e adúlteras? Eu responderia que sim. Tanto quanto qualquer ser humano. Estão sujeitas as mesmas fraquezas dos homens.

Talvez Machado de Assis tenha sido o introdutor da emancipação feminina na literatura brasileira, ou o primeiro a colocar, mesmo que de maneira dissimulada, a igualdade entre os sexos. Suas mulheres não são passivas como as de outros escritores de seu tempo. Mesmo em sua fase romântica, como é o caso de Contos Fluminenses (1870), suas mulheres já demonstram um perfil realista. São ativas, dominadoras, e deixam-nos receosos.

Em Senhora (1875), obra de José de Alencar, ícone do romantismo brasileiro, a personagem Aurélia é trocada por outra moça, por um dote de trinta contos de reis. Emocionalmente romântica que é, no final, após receber uma herança e ficar rica, Aurélia perdoa o amado por trocá-la, casam-se e vão viver felizes para sempre.

No conto Luís Soares, de Contos Fluminenses, Adelaide também foi desprezada pelo amado, Luís Soares, por não ser rica, por possuir somente trinta contos de réis. Aqui também, como Aurélia, Adelaide irá ganhar uma fortuna como herança, trezentos contos de reis, e Luís Soares tentará conquistá-la de novo.

No entanto, diferentemente de Aurélia, Adelaide não aceita o perdão e as súplicas do homem que um dia amou, de nada adianta Luís Soares implorar pelo seu amor. Machado traça o perfil de uma mulher nada romântica e submissa. Sua personagem se mostra uma mulher muito a frente de seu tempo, não se deixa levar pela emoção, age de maneira racional, objetiva e vingativa. É um escritor romântico apontando para um realismo em eminência.

Ainda assim, o leitor poderia dizer-me, mas as mulheres em Machado de Assis são infiéis (real ou supostamente). Sim. Mesmo assim elas continuam a me fascinar. São tão ousadas quanto o sexo masculino, infiéis tanto quanto os homens. Quando elas estão insatisfeitas, desprezadas em seus relacionamentos, quando sentem necessidade de sentirem-se bonitas e desejadas, como D. Severina, no conto Uns Braços, vão trair sim, como uma forma de protesto contra o machismo exacerbado do homem.

Às vezes me pego perguntando, será que eu teria a coragem de me casar com uma dessas mulheres personagens de Machado de Assis? Acho que sim, correria esse risco. Mas, depois, não faria como o joão-de- barro, que apesar de amar para toda a vida, comete uma loucura quando desconfia que a fêmea esta encantada por outro, prendendo-a no ninho, até a morte. Faria como o macho da aranha viúva-negra. Durante a cópula me deleitaria de prazer, para depois, quem sabe, ser devorado, mas convicto de ter vivido a intensa felicidade.

(Texto publicado nos jornais: Diário da Manhã (GO) - 08/09/12 , Jornal do Tocantins (TO) - 23/09/12 e Gazeta New (SE) - 05/10/12.)

Paulo Martinss
Enviado por Paulo Martinss em 10/07/2012
Reeditado em 13/10/2012
Código do texto: T3769893
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2012. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.