Fez-se justiça

               Se Frei Damião fosse sanfoneiro,
               eu taria lascado.
                         Luiz Gonzaga

     Tenho, em uma de minhas estantes, três imagens que me identificam como um nordestino pai-d´égua.
     Vou começar pela primeira: a de São Francisco de Assis. Ela é uma dos meus são-francisquinhos que espalhei pelo meu gabinete de trabalho. São mais de trinta imagens do Poverello, a maioria miniatura.
     Eu as adquiri nas minhas andanças pelo mundo. Só na terra do santo seráfico, a encantadora Assis, comprei oito ou dez; todas lindíssimas.
     Queria dizer que não sou colecionador de imagens; nem imagens de São Francisco das Chagas. Detesto colecionar qualquer coisa. Só coleciono saudades, e como afirmei certa feita, saudades de tudo e de todos...
     É a minha gratidão ao santo de Assis que me faz manter viva e irretocável a devoção por esse milagroso taumaturgo. Dele recebi (e ainda continuo recebendo!!) mais do que mereço.
               ***
     As outras duas imagens são de dois santos ainda não canonizados! Santos não canonizados? Estranho!
     Sim, os dois há muito estão nos altares. Lá foram postos pelos seus devotos, agradecidos por graças alcançadas.
     Digam a um nordestino que o Padre Cícero Romão Batista e o Frei Damião de Bozzano não "estão no céu", e o pau quebra.
     Segundo o romeiro José Vieira Filho, citado por Gildson Oliveira, no seu livro Frei Damião - O santo das missões, o frade e o padre formam uma Santíssima Trindade diferente da que conhecemos.
     Veja o que diz o escritor potiguar: "Na opinião de Vieira, que transporta peregrinos entre Ceará e Pernambuco, a trilogia Pai, Filho e Espírito Santo define-se desta forma: Deus é Pai Eterno, Deus Filho é o meu "padim" Ciço e Deus Espírito Santo é o Frei Damião de Bozzano."
          ***
     Tempos atrás, escrevi sobre Frei Damião, o primeiro missionário que conheci.
     Na oportunidade, frisei que, no sertão do nordeste, ninguém perdia uma desobriga quando o pregador era o querido capuchinho.
     Todos queriam receber a bênção do humilde franciscano, certos de que seus pecados seriam imediatamente perdoados.
     E existiam aqueles que, ao serem tocados por Frei Damião, se diziam curados de doenças que a Medicina não dera jeito.
          ***
     Apesar dos seus conselhos contundentes, o povo procurava segui-los, sem hesitações. Observando-os, dizia-se, mais fácil se chegará ao Reino de Deus.
     Vejam alguns conselhos do missionário Damião:
     Dança - "A dança é um elemento de perdição. Quando um homem e uma mulher se juntam para dançar, não pode sair nada de bom disso tudo. Então, sobrevêm os maus pensamentos , os desejos pecaminosos, o pecado."
     Namoro - "Só na frente dos pais, com uma pessoa solteira. E deve ser breve, com casamento à vista."
     Beijo - "Um beijo dado no rosto da namorada, como um beijo dado numa parente, não tem nada demais, estão ouvindo? Agora, um beijo na boca, um beijo de língua, isso não. É pecado."
     Calças compridas - "Para vós (mulheres que usam calças compridas) está reservado um lugar bem fundo no inferno."
     Frei Damião, com seus conselhos que podem perfeitamente ser considerados ranhetas, ranzinzas, descabidos, exagerados,  foi um pastor sincero e respeitado. Por crentes e não crentes.
     O nordeste beijava-lhe as mãos e, com carinho, tocava-lhe o burel marrom, a cor franciscana, hoje pouco usado, nas clausuras e fora delas!
     Nascido, na Itália, em novembro de 1898, antes de ser Damião, foi Pio Giannotti, seu nome de batismo.
     Morreu no dia 31 de maio de 1997, em Pernambuco, Estado que o recebeu em 1931, frade capuchinho desde agosto de 1923.
          ***
     Por que volto a escrever sobre o "santo das missões". Noticiou-se, esta semana, sem o destaque desejado e merecido, que Frei Damião, até o fim de 2012, será beatificado. 
     O processo de beatificação já estaria concluído, aguardando um pronunciamento do Papa Bento.
     Fez-se justiça. Os do nordeste (eu, inclusive) agradecem. E esperam que o Vaticano beatifique, também, os padres Cícero e José Antônio de Maria Ibiapina, dois exemplares missionários cearenses. 
     
     

      

Felipe Jucá
Enviado por Felipe Jucá em 30/06/2012
Reeditado em 30/06/2012
Código do texto: T3753187