Mulher ao volante...

Tenho certeza de que o leitor já completou essa frase. Afinal ela está bem registrada em seu inconsciente. Além disso, a rima sempre acaba ajudando.

Sempre fui observadora e enxergo até o que não gostaria de ver. Confesso que não gostei nada de quando notei como os homens suspendem a respiração quando uma mulher está fazendo alguma manobra no carro. Olhem, quando digo “suspendem a respiração” não estou insinuando que a mulher precisa ser uma Gisele Bündchen. Pode até ser desprovida de todo e qualquer atrativo. Sabem por que isso acontece? Porque eles gostam de verificar o desempenho delas na manobra do veículo. Se estão conversando, silenciam, se estão apressados diminuem os passos, se estão ao volante, olham através do retrovisor... Será que estou exagerando ou simplesmente sendo realista?

Na época em que fui tirar carteira de habilitação, não consegui passar da primeira vez. Foi exatamente a baliza que me reprovou. Eu me saí muito mal ao realizá-la. Depois disso, bateu uma tremenda insegurança, mesmo tendo me saído bem na segunda vez. Mas perdi a confiança e sempre desistia de tentar entrar numa pequena vaga. Acabava procurando um lugar mais fácil. E se acaso havia pessoas observando, a situação piorava, pois eu nem tentava. Assim passei um bom tempo fugindo dessa situação. Para falar a verdade, às vezes até me esforçava para superá-la, mas quando percebia a atenção das pessoas voltada para mim, mudava de ideia.

Uma vez uma amiga me falou:

— Isso não existe. É pura desconfiança sua!

— Antes fosse! Vamos fazer um teste agora mesmo?

Procurei lugares mais movimentados, principalmente onde a concentração masculina predominava e me preparei para uma baliza. Eu mal havia emparelhado o carro e ela foi mudando de humor. De repente, falou:

— Nossa, todo mundo está olhando pra cá! Vamos embora antes que eu acabe falando alguma coisa.

Fiquei rindo e falei:

— Agora você acredita, não é? Pensando bem... acho que não devia ter te despertado para isso. Você é muito estourada!

Sabemos que as seguradoras dão descontos quando o carro é de mulher. Isso acontece porque as estatísticas revelam que com elas há menos infrações. Mesmo assim, alguns homens dizem que isso ocorre porque elas são medrosas e não por dirigirem melhor.

Não sou nenhuma exímia motorista, mas a minha insegurança já está superada. Assim sendo, não me importo mais quando vejo que estou sendo testada. Há poucos dias, ao ocupar uma vaga numa movimentada rua, percebi que ela mal cabia o meu carro. Mas, insisti em ocupá-la, consciente que teria que manobrar muitas vezes. Não sei o que aconteceu... pois consegui encostá-lo na primeira tentativa. E com que perfeição! Dei uma olhada para ele, enquanto atravessava distraidamente a rua. Quando olhei para o lado oposto, vi alguns homens parados na porta de um estabelecimento, olhando para o meu carro com expressão de surpresa. Parecia até que ele era algum modelo exótico ou alguma antiguidade de colecionador. E olhe que ele não passa de um modelo popular com a cor mais comum possível. Nessa hora vi que eles haviam presenciado aquela fantástica manobra e percebi que os seus olhares me aplaudiam...

Outro dia, entrei em um estacionamento e o seu responsável, falou com um tom que revelava uma certa impaciência:

— Pode voltar lá na entrada do portão! Não tem como você estacionar do jeito que entrou.

Calmamente, retruquei:

— Acho que vai dar. É só manobrar mais vezes.

Ele continuou irredutível:

— Não vai dar! Você entrou mal!

Fechei os ouvidos e continuei. Aquilo acabava de se transformar em um desafio. Foram apenas duas manobras e o carro ficou exatamente no lugar que deveria ficar.

Coloquei a cabeça para fora e falei com ele:

— Quantas manobras eu fiz?

Com um sorriso amarelo, ele respondeu:

— Duas...

Com bastante suavidade, falei:

— Você não tem culpa de ser assim! Essas coisas estão alojadas no inconsciente dos homens desde que o mundo é mundo.

Ele insistiu em afirmar que eu estava enganada e que sempre achou que as mulheres dirigem como os homens. Sorri e falei:

— Ainda teremos que viver um bocado de tempo para que esse registro se apague. Mas não se preocupe, já estou acostumada!

Déa Miranda
Enviado por Déa Miranda em 29/06/2012
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