CONTO 2 - A PRAGA.

1961,Caio, jovem que vive a vida com intensidade, adquire a motocicleta de seus sonhos. Já trabalhava, embora novo, dezenove anos, e deu como parte do pagamento uma lambreta que possuía, pagando o resto em dinheiro. Comprou uma Norton Manx, famosa por ser de especial cilindragem, motorização possante, uma máquina esportiva inglesa. Era seu dono um conhecido líder de motociclismo, ia se casar e precisava de dinheiro.

Caio desfrutava dos sabores daquela incrível máquina, com descarga única em forma alongada, em bronze mandado fazer, com diâmetro igual ao do grande caneco(pistom) do motor. Uma quinhentas de cilindro avolumado própria para corridas, queixo baixo.

Todos ficavam loucos com seu som, o grito de uma fera, rasgando os ares em uma pequena esticada de primeira, ou quando Caio ajustava, perto do acelerador, em manete para tanto, seu magneto manual, adiantando ou atrasando um pouco a rotação. O motor tocava quase um samba rouco e surdo da fera, todos vibravam.

Certo dia um “invejoso” lambreteiro, valentão, lutador marcial, disse: “essa moto tem essa arrancada toda ou é presepada sua?” Caio disse, não sei, quer conferir, senta na garupa. O cara sentou. Caio passou a primeira e deu gás aos poucos, a fera cresceu, quando arregaçou toda a primeira jogou no empuxo a segunda, o cara ficou no asfalto, deu uma cambalhota para trás tamanho o tranco na troca da marcha. O cara disse: Que coisa! Quer vender? Caio respondeu, de jeito nenhum, E veio a praga, “se não for minha não vai ser sua”.

Semana seguinte a agulha do carburador estava agarrando em seu cursoquando da aceleração maior e a moto por vezes gritava toda acelerada. Caio acionava a embreagem e soltava com a mão esquerda a agulha presa no pequeno funil aberto no carburador, logo abaixo da sela, era simples. Precisava fazer o reparo, mas como acontecia pouco ia deixando.

Querendo cravar a sapata de freio, como era antigamente, as famosas lonas, deixou a sapata traseira para cravar. Parava a moto na redução, poderosa que era, e com um pouco do freio da frente, dito de mão, que não pode ser acionado totalmente sem conjunto com o traseiro, estando em alta velocidade, sem o que a moto sai de lado.

E lá foi Caio para um baile na faculdade que cursava. Acabado o baile uma das moças que era sua amiga e estava de carro com a mãe de uma delas quis ir na garupa de Caio. A senhora que estava responsável por elas não permitiu. Evitou uma tragédia...

Caio, exibido, subiu na fera e deu gás total na primeira para vazar na noite seu ronco e mexer com os hormônios das meninas que vinham bem atrás no carro, quando jogou segunda sentiu o gosto da morte na boca. Em poucos metros acabava a rua, sem freio traseiro, agulha do carburador agarrada e a fera crescendo, já desenvolvendo mais de cem. Tudo em curto espaço de dois quarteirões. Não podia frear de mão e nem acionar a embreagem, quarenta metros em frente uma esquina que findava a rua, ia se despedaçar no muro da casa do outro lado da calçada da rua frontal onde terminava a que estava.

Passou para o estribo da esquerda e pulou. Subiu como um foguete depois que bateu em pé no chão, e rolava tanto que deu tempo para pensar, vou bater com a cabeça em algum lugar e vou morrer. Rolou muito, mas com os braços protegendo o rosto, era praticante de lutas marciais e sabia se defender. De repente estava sentado no asfalto, rolou mais de quinze metros, todo rasgado, escoriado e ensanguentado.

Ficou em pé, as moças se aproximaram, e gritavam. Ele está vivo!!! O levaram para o hospital, nada quebrou. A moto bateu no muro da casa, com grande estrondo ouvido em todo o bairro e comentado, ficou na história. A moto em fúria desabrida depois de perder seu cavaleiro,agigantou-se em velocidade bateu a roda da frente no meio fio e foi empinada como se estivesse em pé de corpo inteiro no muro da casa, ficou como um punhado de ferro amassado, levou o muro e o portão até à varanda da casa, dez metros para dentro.

Se a moça estivesse na garupa Caio não poderia sair fora, morriam os dois, e essa história não poderia ser contada. Estariam mortos. A praga “pegou”. Em casa chegando, Caio, com roupas do pai de uma das moças, prometeu para a mãe nunca mais andar de moto, continuou andando a vida inteira.....

Celso Panza
Enviado por Celso Panza em 29/06/2012
Reeditado em 17/07/2012
Código do texto: T3751273
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