O BILHETE
O BILHETE
Naquela 4ª. Feira , era o segundo dia que Dirce e Flora estavam às voltas com as compras no lado do Paraguai. Flora tinha poucas pessoas a quem presentear, mas comprar era um de seus fracos, porque jamais se cansava de encher e esvaziar sacolas, com tantos penduricalhos e bugigangas. Houvesse dinheiro, sua ânsia de comprar jamais ficaria satisfeita. Por outro lado, Dirce, que além de filhos, já contava com alguns netos, completar sua lista, era um nunca bastante, para poder contentar às filhas e mais os filhos destas. Foram dois dias de horas intermináveis de compras. As amigas saiam juntas pela manhã, voltavam logo que as sacolas ficavam abarrotadas, e era necessário, esvazia-las para novas investidas, no mercado, que era farto e generoso na multiplicidade de ofertas.
É intuitivo que em todo lugar onde haja “queijo, deve existir ratos...” logo, onde há muito dinheiro e igualmente muita gente, alguns desavisados e até ingênuos, se é que ainda existe essa classe de pessoas, paralelamente vicejam espertalhões, gatunos, ventanistas e congêneres. E em P. Strossener, por que haveria de ser diferentes? Justamente lá, onde o fluxo de endinheirados, prevenidos e descuidados, é grande na messe. E, massificadas, por um contingente humano heterogêneo, é que se achavam confusas e confundidas, nossas duas focalizadas, num processo de enchimento de sacolas e esvaziamento de dólares, porque nem o cruzeiro a moeda vigente àquele tempo, era aceito.
Sentadas agora, 3 horas da tarde, sob a temperatura de 38º, Dirce e Flora, trocavam opiniões sobre as vantagens das compras e lamentavam-se de não terem trazido mais dólares, para trocarem por mercadorias. Por que onde se viu?
Perguntava Dirce, que era a mais perdulária , onde se viu?Ela voltou a repetir, comprar Tênis de”marca” até por 50 dólares.
_ Você achou tênis por 50dólares o pé? Perguntou flora, com naturalidade como se fosse possível.
_ Você ta sonhando, Flora? Existe isso, comprar só um pé de tênis?!
_Uai Sá, até que podia se a pessoa fosse coxa.
_ Outro pé ficaria para o próximo coxo? Perguntou Dirce em tom de ironia.E Flora com toda sua parva inspiração completou.
_ Mas teria de ser coxo, de pé contrario.
_ Vamos mudar de assunto sugeriu Dirce.
_ Olha você me espera e vai arrumando nossas compras, que me lembrei de levar uma coisinha para o César, afinal é ele que está financiando minha viagem.
_ Foi bom você se lembrar, por que também me esqueci do Arcanjo.
_ Depois você vai fica ajeitando as coisas porque nosso ônibus sai as 8 horas e até o jantar, tudo isso já deve estar nos seus lugares Dirce não esperou pelo sim de sua companheira e foi saindo.
Ora, se uma coisa desagradou a Flora, era estar sozinha. E justamente era essa razão por que ela sempre estava disponível quando as amigas a convidavam para sair. Se o marido não estivesse em casa ela também não ficava. Movida por esse pensamento, tão logo a sensação de estar só, sopitou-lhe na mente, ela saiu. E supondo que Dirce viria diretamente para o quarto teve a “luminosa” idéia de deixar um bilhete para amiga.
Redigiu-o e pregou-o na porta “A CHAVE ESTA DEBAIXO DO TAPETE” e se foi confiante na sorte .
Ao regressar que desolação. Encontrou Dirce aos prantos, estatelada na cama com os olhos inundados de lágrimas.
_ O que aconteceu?
_O que aconteceu, você ainda pergunta ?
_Onde você colocou nossas compras!
_ Uai, onde nós as deixamos aqui em cima das camas, onde seria?
_ Pois então procure e veja se as encontra. Já fui na portaria e eles me responderam que, se não estão onde as deixamos é porque as roubaram e que aqui, o que mais tem é ladrão.
Então vamos dar parte à policia, ou você já tomou essa providência?
_ E adianta?
_ Não sei, disse Flora, mas sem nossas compras é que não poderemos voltar para casa.
Olha aqui o bilhete que encontrei na cama “ OBRIGADO POR TEREM DEIXADO O BILHETE ONDE ESTAVA A CHAVE. FOI EM VERDADE UMA GRANDE DELICADEZA DE SUA PARTE, NÃO PENSEM QUE FICAREI COM SUAS MALAS AMANHÃ MESMO DEIXO-AS NA PORTARIA. MAIS UMA VEZ OBRIGADO.
O AMIGO PARAGUAIO.
_ Você deixou algum bilhete, indicando o local da chave?
_ Deixei sim, pregado na porta. “A Chave esta debaixo do tapete”.
Agora disse Dirce, não adianta chorar, é calçar a cara mas não conte pra ninguém que fomos roubadas por causa de seu histórico bilhete.
_ E como voltaremos?
_ Sem compras e sem dinheiro, E ainda bem que as passagens de volta estão comigo, se não voltaríamos a pé.
_ A pé?! Flora perguntou
_ A pé, respondeu Dirce
_ E eu agüento?
Dirce deu-lhe a resposta de Cambrone.