Suave discrição

Passava do perfeccionismo doentio a vadiagem absoluta. Depois se debruçava na crise expressionista da incerteza. Em seguida sobrevinham-lhe percepções felizes. Quando alguém desenhava o seu retrato, ignorava. Mesmo moída pelo incógnito das coisas que são ignoradas, mantidas na condição de desprezo, espezinhadas como um vaso enigmático mantido permanentemente no mesmo espaço entre o pó e a lembrança; a reação funcionava como comunicação pictórica, quase ideográfica. Fundamentalmente era o tesouro da arca um retrato poético. Vamos. Vamos brincar de espaço antes do adeus noturno. O sonho obedecerá ainda o tempo confeccionado entre a vida geográfica e às grandes expansões.

Ninguém amou mais aquela presença diante do indissolúvel problema da impermanência. Ninguém ousaria desmentir. O privilégio de compor e decompor o mesmo mistério entre mãos cálidas, doces. Criatura de alma alada… Elevada a mais alta excelência! A suavidade é a perfeição da discrição, diga-se, da simpática plenitude. Certamente nela até o cinismo era pacato. Para canduras lunares oriundas de perfeccionismos, esse mesmo que minutos antes declarava ser desvio, agora era dimensão da percepção e perdurava como encantamento simbólico. Misto de expansões líricas desusadas e o amor na fase aura.

Fase aural das tantas em voga, porém, inovadora, de ocorrência visual, fenômeno da ótica. Lugar onde moram com todos os grandes pintores mágicos. Sem esquecer os encantadores mentirosos em último estágio. Megalomaníacos mitômanos. Escultores da filosofia equilibrada, constante, feito bicho. Distante demais da simples alegria de viver, cantar, sorrir, beijar.

Perfeccionismo é palavra forte. É viver sem resíduo de inexatidão. Serve para zombar de gigantes mimados pela inteira ilusão de tudo, pois, tudo tem pecado ou desbota. Sem

pecados apenas vive a paisagem sonhando. Vicejando pirilampos entre objetos da realidade. Parece fácil dizer, até pensar, mas o ego do amor é a felicidade prenhe que está para ter. Noção vívida apenas através da ação onírica que consiste na promessa. Discreta utopia singela: todos têm direito ao reconhecimento da própria face esplêndida. Pronto para considerar um elogio para um soldo.

Talvez fosse melhor compreender o tempo, configurar o tempo. Para tanto passamos longe da perfeição sem dormir a noite reunida. Prontos para especificar cada sonho dentro da própria estrela notívaga. Dar vela para mar de almirante, prosseguir, vadeando. O amor passa quase sem embates entre o perfeccionismo doentio e a vadiagem absoluta.

Tércio Ricardo Kneip
Enviado por Tércio Ricardo Kneip em 26/06/2012
Reeditado em 22/06/2020
Código do texto: T3745574
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