O CRIME DA MEGA-SENA

Na minha opinião, a polícia tem resolvido crimes com muita facilidade baseando-se em indícios. Por indícios, que é fé, jamais se poderia submeter alguém a um tribunal. Fácil é associar indícios as pessoas seguindo temáticas estabelecidas por probabilidades óbvias, como no caso da mãe a quem o delegado atribuiu a morte da filha por ingestão de cocaína. Por certo o fez para valorizar seu trabalho frente a opinião pública.

Nos últimos tempos os conceitos de probabilidade têm sido invertidos por força de intenções latentes nas pessoas tidas por de bem. Chegou-se ao ponto de ter-se por mais provável (e parece que é como se quer pensar) que uma mãe mate sua filhinha (mesmo que forçando-se-lhe as razões, contrariando a coerência de que hipotetizar isto é um absurdo), do que lembrar que mães tendem naturalmente a proteger os filhos. Tais hipóteses somente brotam, assim, sem provas concretas, em mentes de potencial vilania, mais ocupadas de si mesmas, sua imagem, carreira e ganhos, do que com os efeitos que produzem nas pessoas cuja vida lhes é posta nas mãos.

Delegados têm tratado da vida alheia com leviandade, valorizando mais aos mortos do que aos vivos, pessoas que podem ou não ter cometido crimes, mas que têm também seus filhos e são parte dessa sociedade, que em parte se torna irracionalmente sedenta por vingança e linchamento, ao ponto de resolver crimes com estralar de dedos fundamentando-se em indícios. É provável que o caso coronel Ubiratan, que milhares de pessoas tinham bons motivos para querer ver morto, seja um desses, onde parece que incriminar a namorada foi a via mais fácil.

E o crime terá sido resolvido? Devíamos nos preocupar com isto.

Quanto a se a viuva no crime da Mega-Sena é ou não o que o delegado determina com base em indícios e crenças, prefiro que o funcionário do povo prossiga seu trabalho explorando hipóteses menos óbvias, pois ganha para isto. Que apresente provas materiais contundentes, que não precisem ser associadas forçosamente com o cuspe mal colante de indícios obscuros.

Não é bom fundamentar-se em indícios e crenças ao decidir a vida alheia, pois a parcela pensante da sociedade repudia tentativas de transformar em fatos teorias que não conseguem ultrapassar a esfera das suposições. Delegados, jornalistas, juizes, etc., não são deuses para terem certezas absolutas baseados em indícios, tampouco para deliberarem sobre a vida dos outros com tanta leviandade. Tais conclusões não merecem reflexão séria, tampouco crédito. Como observador, me nego a dar veredicto com certezas colhidas tão rapidamente. Não lidamos com plantas ou bichos, mas com seres humanos, que não são cartolina.

É sórdida a contradição quando em defesa de mortos faz-se injustiça contra vivos, sendo que a hostilização de culpados já é uma irracionalidade improdutiva.

Wilson Amaral

Wilson do Amaral Escritor
Enviado por Wilson do Amaral Escritor em 08/02/2007
Código do texto: T374195