Você é homem ou Coca-Cola?

Você é homem ou Coca-Cola?

Esta pergunta assombrou minha primeira infância junto à imagem do ultrapassado Fofão - aquele personagem televisivo das bochechas redondas. Bastava uma agulha de emoção para meu pai me pegar nos ombros, alinhar minha postura, olhar nos meus olhos e declarar a retórica questão:

- Você é homem ou Coca-Cola?

- Homem...

- Homem não chora. Então engole esse choro e vai brincar.

Fungadas depois lá ia eu, batalhando contra o impulsivo chororô da pequena idade. Era sufocado pelo severo posicionamento masculino.

Meu pai é da velha guarda. Tinha 41 anos quando nasci. Direto e, por algumas vezes, ríspido. Quase sempre amável, do seu jeito. Como seu pai o ensinou, e como o pai de seu pai ensinou a seu pai ele continuou a transmitir as sentenças que forjavam a concepção paterna da vida.

Leis e normas que nunca foram oficializadas por órgão algum, mas que regem o subconsciente masculino. Fazemos o que fazemos sem nunca saber o porquê fazemos.

Diferente das mulheres, que para cada reação existe uma razão, os homens simplesmente agem. Apesar da incredulidade feminina somos verdadeiros meninos quando tomamos certas atitudes. Ingenuidade pura.

Agimos assim porque nos programaram para agir assim.

Três características destacam-se. Situações que retratam a influência paterna na vida adulta do homem.

O homem está mentindo quando expressa uma verdade inquestionável.

As mulheres ficam furiosas quando questionam maridos e namorados sobre algo e ganham risadinhas e sarcasmo como resposta. A impressão é que foi traída e ele nem, ao menos, importa-se em esconder isso.

Calma. Não aconteceu nada. Por não ter culpa alguma não há o porquê de receio e insegurança. Não há a necessidade de engatar um diálogo novelístico. A fuga da DR, assim, é certa.

Mas quando o contraponto foi assertivo, conclusivo e convincente tenha cuidado. Desde a infância ele aprendeu a negar, negar e negar veementemente quem quebrou o vidro da janela da sala com a bola para evitar um encontro com o cinto do pai. Uma conversa de homens é moldada pela seriedade. A repetição o tornou um craque nisso.

O homem está realmente magoado quando se preocupa exclusivamente com as mazelas da mulher.

A pressão do pai em formar alguém responsável, maduro e independente acelera o individualismo do sujeito. Quando o contato com a linda flor que embelezará sua vida é iniciado, o altruísmo começa a ser praticado. Levará a vida toda para este detalhe ser aperfeiçoado. A frustração própria, a culpa pelos erros cometidos e o senso competitivo torna-o o ser mais amoroso da quadra onde sua casa está localizada.

Amoroso não quer dizer romântico. Não falo de buquês, mas de atenção. Não penso em palavras bonitas, mas em ouvidos dispostos.

Como dizia seu pai: você tem que ser bom em algo. O fracasso em uma área resulta em esforço para vencer em outra.

Esta situação nos leva para algo que todos os homens negam, mas no secreto sempre fazem. Algo que todas as esposas sonham em presenciar para exercerem seu ímpeto materno. Algo que ninguém verá a não ser o reflexo do espelho. Homem quando demora no banheiro não está apenas se barbeando, está desabafando, está chorando.

Ambiente profissional competitivo, família que aguarda provisão e cuidado, amizades que esperam risadas e boa companhia, onde mais ele poderia encontrar um momento de silêncio com a dor a qual sua alma sucumbe? Onde ele poderia esvaziar-se das cruéis lágrimas que sufocam seu espírito? Onde ele poderia esconder-se do olhar de recriminação de seu pai? Isso mesmo, nos alvos azulejos do banheiro.

Amiga leitora lembre-se de agradecer a seu sogro por forjar esse serzinho ao qual você é apaixonada. Se não fosse por ele, seria uma monotonia este relacionamento. Afinal, seu talento para observação não seria surpreendido pelas ações dele.

Amigo leitor, não fique triste, irritado ou magoado com seu pai. Ele não foi abusivo. Ele apenas ensinou o que aprendeu. Por mais que existam filosofias e correntes de pensamento hoje, ele fez o que devia fazer, o inseriu na realidade da sociedade. Não seja Coca-Cola. Prefira Sprite, encare as coisas como são.

Eduardo Dorneles
Enviado por Eduardo Dorneles em 23/06/2012
Reeditado em 23/06/2012
Código do texto: T3740059
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