A morte de um pássaro
Sempre nessa época do ano, as árvores do meu jardim ficam movimentadas de pássaros das mais diferentes espécies: saíras, sabiás, colibris, rolinhas, cambaxirras, bem-te-vis.
As saíras são as mais abundantes, suas muitas cores variando do cinzento ao azul, do verde ao amarelo-casca-de-banana, do marrom-avermelhado ao preto.
Estava eu ao fogão durante uma tarde muita fria fritando bolinhos de chuva, quando ouço um estrondo na porta de vidro da sala. Corri para ver o que era, e deparei com uma saíra cinzento-azulada caída no chão. Ela tinha batido contra o vidro. Tentei reanimá-la, mas do seu bico já corria um fio de sangue, que logo manchou a palma de minha mão, e ela piava fracamente. Fiz de tudo: joguei-lhe água fria na cabeça, soprei-lhe o bico, massageei de leve suas asas. Mas sua hora havia chegado.
Pouco a pouco, senti a vida se esvair daquele corpo, que tornou-se inerte. É incrível perceber a energia da vida que se esvai. É como se algo realmente saísse do corpo, que se torna vazio e grotesco.
Segurei-a ainda durante algum tempo, lamentando profundamente não ter podido fazer nada para salvá-la. Certas coisas são inevitáveis, só nos cabe aceitá-las.
Enterrei o corpo num canteiro de camarões, devolvendo-o a natureza. Mas sei que a saíra continua voando por aí.