Bolinhas de gude

Dentre os jogos infantis de Bom Despacho, descalça e poeirenta que conheci, nenhum tinha um vocabulário tão específico como o jogo das bolinhas de vidro ou bolinhas de gude.

Na Praça São José ou na Praça da Matriz, no Larguinho, Jardim Sem Flor ou em qualquer outra via pública da Tabatinga ao Quenta Sol. Da Vila Militar à Cruz do Monte, a molecada se reunia com os bolsos retinindo de bolinhas compradas na Casa Assumpção, no Leão da Esquina, na Ladeira ou no Armazém do Pepê.

Se o chão estava seco, fazia-se um buraco na terra, a canivete ou com um pedaço de pau. Estava-se molhado, bastava rodopiar o calcanhar e o pila estava feito. O jogo começava. Tinha as bolinhas coloridas, muito cobiçadas, as carioquinhas. As grandes do tamanho de um limão pequeno eram os timboloscôs. As regras do jogo tinham um vocabulário com muitos “SS” (esses), como o linguajar do Moçum, se a bolinha estava longe e a do adversário dentro do pila, você gritava:- Vou conformes!

Isto se o outro antes não dissesse: - Obrigues!

Se caíam duas bolinhas no buraco: - Mil ranques é do jogo.

Ouviam-se sentenças como: -Retes, mão no joelho, quietes.

E frases cabalísticas como: - Bororôzi, num dô nada e tudo.

Às vezes, a gente saía de casa com os bolsos cheios de bolinhas e voltava sem nenhuma. Noutras, ao contrário, a gente bigodava o companheiro e deixava-o triste e de bolso vazio.

Os jogos de computador e videogames de hoje são mais sofisticados e inteligentes, mas não têm o poder socializante e mágico das bolinhas de gude. Coisa do passado, de um passado romântico dos setenta e nove anos de uma cidade branca, plantada em três colinas das Minas Gerais, esta Bom Despacho querida, que hoje abraçamos com amor filial.

Parabéns minha terra, meu céu, meu lar, em mais um ano de seu aniversário, de sua emancipação como cidade e como município.

TAAT
Enviado por TAAT em 19/06/2012
Reeditado em 28/03/2013
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