E se todo mundo agir assim?
Nos últimos tempos, depois de falar sobre qualquer coisa que eu penso, volto para casa com a sensação horrível de arrependimento. Parece haver, ou seja, há sempre uma condenação diante do que eu disse, desde assuntos corriqueiros e banais aos mais exigentes de cuidados. Isso tem me causado um mal danado e de repente, penso seriamente em obedecer à sugestão honesta de uma colega que disse: "é preciso se preservar."
Preservar = (v. tr. e pron.) Pôr ao abrigo (de algum mal); resguardar.
Que mal pode ser maior do que não ter contato com nós mesmos? Há quem consiga. Há quem não entende. Há quem entende e não consegue. Tenho medo e dúvidas, mas não duvido que é possível. Pois, estando eu em terra estranha é preciso dançar conforme a música. É preciso esquecer que entre o escuro beco largo da negação e a clara rua estreita da verdade, corro risco sério de se perder. Mas quem se importa, não é mesmo?
E se todo mundo agir assim o tempo todo?
E se não existir um jeito de acreditar?
E se tudo for ilusão?
E se só for possível sobreviver se eu arruinar meu interesse pelo essencial?
Pessoas de verdade.
Ou seja, tudo é horrendo demais se, ao final, eu não ganhar o atestado de boa pessoa e portanto, preciso com urgência pôr em abrigo as rugas e cicatrizes da alma, elas são feias e não interessam.
Preciso me manter escondida diante do olhar do outro e me render ao constrangimento da superficialidade, numa concepção cruel e estranha, sem a mínima possibilidade de lidar com meu medo de ser assim.
Do contrário, é fácil escandalizar, porque o terror que fingimos não conhecer é tão familiar que é mais conveniente se manter em cima do muro frágil do padrão, o qual se apresenta sem defeito.
Vai que por uma ironia eu olhe demais para dentro e deixe escapulir algum sapo! Não! Não é seguro!