ZUMBIS

ZUMBIS

30/04/2012

Já se vão alguns anos quando em uma de minhas viagens para Pouso Alegre-MG onde prestava consultoria para uma revenda de automóveis, viagem que fazia de Gontijo tendo em vista as ótimas condições da estrada, ótima para as empreiteiras de conservação. Como de costume sentava na quarta fileira de poltronas sempre na janela. Devia ser uma terça-feira, estranhamente o ônibus estava com seus lugares quase todos tomados, motorista a postos liga o motor, fecha a porta por um breve instante e volta a abri-la para dar entrada a uma jovem de cabelos negros e lisos que me fez lembrar minha filha que estava de mim distante. Sentou-se ao meu lado, e depois de um longo suspiro murmurou um graças a Deus, e como que pedindo desculpas se apresentou dizendo ser advogada vinda de São Paulo e que teve uma reunião no Itaú em BH e estava indo para Pouso Alegre onde no dia seguinte cedo teria uma audiência e por causa do transito quase perdeu o ônibus e por conseqüência a audiência.

Pessoa simpática e apesar da pouca idade se mostrava bem articulada e interessada em dar seqüencia a todo o planejamento de desenvolvimento que fizera para sua carreira, que fez questão de explicitar. Papo fácil e interessante ajudou para que a viagem passasse rapidamente. Devemos ter trocado cartões que se perderam com o tempo, me lembro de tê-lo procurado em minha carteira quando peguei o ônibus de retorno a BH na quinta sem encontrá-lo.

A perda deste cartão me fez pensar que esta seria uma das pessoas que provavelmente eu jamais tornaria a encontrar e nessa linha fui relembrando de várias passagens que provavelmente não reviveria. Minhas professoras e colegas do primário, do Instituto Nossa Senhora do Carmo ou do Frei Leopoldo, colegas do Dom Silvério, do Padre Machado, e do Anglo Americano em Botafogo, no Rio. Amigos de turma na adolescência. Colegas da FUMEC. Namoradas do Santo Antonio e Funcionários. Outras de BH, Sabará, Leopoldina, Barbacena e outros cantos que me ajudaram a conhecer a fruta e me ensinaram cultivá-la. Foram quase 400 Km de lembranças resumidas em mais de 6 horas de um chacoalhar que as vezes mexia com o cérebro e mudava a cena.

Outro dia já neste ano estava no aeroporto de Confins esperando o retorno do meu filho, comendo um pão de queijo, que pelo preço deveria ter muito mais queijo, quando na cadeira a meu lado senta-se uma jovem que por descuido deixou que sua bolsa me acertasse. Pediu desculpas e se apresenta como advogada de São Paulo vindo para uma audiência. A sensação de “déjà vu” se fez presente. Relembrei aquela viagem de anos atrás. Desta vez eu estava mais triste provavelmente pela insistente companhia da solidão que não me saia do lado e o provável reencontro com o passado que por vezes se fazia presente.

Todo este cenário: a impotência de uma espera por um vôo atrasado, a solidão por companhia e a sensação de “déjà vu” me fez pensar que a morte sempre está ao nosso lado muito destes personagens com quem troquei suores, afetos, carinhos, palavras ou simples olhares, não vejo e não verei jamais. Certamente muitos, a imensa maioria ainda está viva, mas para mim nada mais são do que mortos vivos nas minhas lembranças.

Geraldo Cerqueira